SEIJI OZAWA – EM 50 CDS – PELA DEUTCHE GRAMMOPHON

A toda vez em que me defronto com algo repelente ou absolutamente inaceitável para os meus valores, procuro um antídoto, uma vacina, qualquer coisa que me livre da visão ou sensação.

Dia desses, início da madrugada e zapeando pela televisão, caí em cena tenebrosa de um filme chamado “Em Luta pela Liberdade”, ou em busca… tanto faz. É sobre a condenação de um inocente a morte. Um tema que não digiro, não aceito, não assisto e não canso de mostrar o meu desprezo, oposição ou seja lá o quê for e contra quem for.

Sou radicalmente contrário e não importa o motivo da condenação.

Mudei imediatamente.

Caí, por sorte, em um concerto no Japão, com SEIJI OZAWA regendo a SEGUNDA e a SÉTIMA sinfonias de BEETHOVEN, com a “SAITO KINEN ORCHESTRA”, criada por ele em 1992 para divulgar músicos japoneses e sob o controle e a visão do grande maestro.

Claro, concerto no Japão, durante o FESTIVAL DE MATSUMOTO, em 2016. Um momento sublime, portanto.

SEIJI OZAWA é raro e precioso.

Nasceu na China, em 1935, durante a “ocupação japonesa”, e a família retornou ao Japão, em 1944.

Começou estudando piano, mas à semelhança de JOÃO CARLOS MARTINS, nosso grande pianista, machucou-se gravemente. SEIJI estava jogando RUGBY. Foi obrigado a largar o piano e passou a estudar regência.

OZAWA é possivelmente um gênio. Trabalhou com CHARLES MUNCH, VON KARAJAN e LEONARD BERNSTEIN. É um cara de vanguarda, incentivador de compositores contemporâneos em repertórios orquestrais. É encrenqueiro conhecido e regente de sonoridade, convicções e ideias muito originais.

Em meados da década de 1970, ouvi e comprei disco regido por ele com a SIMPHONIETA DE JANACECK, obra contemporânea que me deixou maluco – mas que não repus, ainda, em minha discoteca.

Comprei, também, uma cantata de BRAHMS, se não estou enganado, simplesmente imperdível.

O japa é esfuziante! Um regente de garra, grandiloquência sonora, e gestos precisos. E mesmo tendo gravado, e conhecer a fundo compositores como BEETHOVEN, entre vários, suas interpretações sempre são únicas, pessoais, talvez inusitadas. E mesmo eu, que deixei um pouco de lado a música clássica, jamais esqueço artistas como ele.

O que assisti, ontem, pareceu-me perfeito nas circunstâncias. SEIJI, com mais de oitenta anos, vestido de maneira informal à japonesa, velhinho mas quase lépido, cumprimentando e até confraternizando com seus músicos, regeu uma orquestra moderna, “multinacional/racial”, como quase certamente é a maioria das orquestras contemporâneas importantes.

A certeza do que pretendia com BEETHOVEN, a compreensão dos gestos até por mim, um leigo, para efetivar a regência; e aquela coisa indefinível, algo entre o celestial e o mundano elevado ao estado da arte, compensaram a minha quase incontida ira ao dar-me de frente com as ignomínias a que o mundo nos submete!

Publiquei um desejo imenso nesta foto e texto. Estou inclinado a correr risco e trazer este box para mim.

É a fase áurea de OZAWA. BOX com 50 cds em capas originais e, certamente, um livreto adequado para expor uma vida intensa, grandiosa, bela – arrogantemente bela! – por contraditório que eventualmente possa parecer!

SEIJI OZAWA, mesmo doente, continuava cabeludo, inquieto e decidido, sempre em linha com o contemporâneo. Está em vias de tornar-se imortal. É uma criatura em conformidade consigo mesma. Mas jamais em paz! O maestro é um rebelde com inúmeras causas; praticante da contestação e da ousadia, exercidas com método, proficiência, e uma peculiar forma de transmitir satisfação com os vários deveres cumpridos

Eu quero esse BOX! postagem original 17/01/2023

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