Imagine você e mais sete amigos partindo para um rolezinho no Shopping Iguatemi, ou no Shopping da Barra?
Vocês chegam, combinam encontro de dez em dez minutos em ponto pré definido, e saem cada um para o seu lado, fazendo o que bem entender, mas dentro de esquema de transgressões inteligíveis, engraçadas, estudadas, mas libertárias a ponto de não serem identificadas por quaisquer outros dos seus amigos?
Louco, não?
Pois é; isto é o FREE JAZZ!
TOCAR FREE não é fazer qualquer barulho, qualquer coisa com o instrumento mas, sim, dar fluxo à imaginação com técnica, liberdade, espontaneidade; e de jeito que um compasso não seja como o seguinte; e a execução sempre diferente da outra, de modo que a música feita seja renovada a cada performance e, mesmo um disco gravado, portanto limitado no espaço físico, sempre seja inovador e surpreendente a cada audição.
É por aí!
Pois bem, essa experiência revolucionária foi realizada por ORNETTE COLEMAN E MAIS SETE MÚSICOS, em um disco inigualável, seminal, perturbador, gravado em 1961, chamado simplesmente “FREE JAZZ”.
O disco se apresenta inovador desde a capa. A edição original tem pinturas que remetem a JACKSON POLLOCK e à modernidade das artes plásticas, rompendo com o padrão hip- sofisticado-recatado-desafiador das capas dos LPS de JAZZ dos anos 1950. Há, inclusive, uma janela que comunica parte externa da primeira capa do LP com a interna. É arte moderna da melhor qualidade!
Eu comprei o disco por volta de 1975, mas não era a primeira edição que descrevi – infelizmente! Procuro uma original até hoje! Custa caro e é quase impossível de se conseguir! Mesmo assim, encomendei uma reedição atual em vinil. Aguardo.
A experiência de ouvir DOIS QUARTETOS DE BAIXO, BATERIA, SAX e PIANO TOCANDO SIMULTANEAMENTE, é avassaladora.
Existe um tema central que todos compartilham, alguns pontos de encontro em que todos tocam juntos, e o resto é improvisação.
ESSE DISCO É O PREGO NO CAIXÃO DA GRANDE CANÇÃO AMERICANA DOS ANOS 1950 – um passo bem além de SINATRA, ELLA, BILLIE, SARAH… Um sakto a frente incomparavelmene desafiador!
Se você pensa que ROCK, principalmente o clássico dos anos 1950 é vanguarda, então não tem a menor ideia do que é transgressão.
Claro, a obra tem origens; não veio do nada. No final da década de 1950 MILES DAVIS, JOHN COLTRANE, CHARLIE PARKER e mais uma infinidade de outros, já fazia, ou havia feito, um som totalmente fora do melódico e harmônico tradicional…
Para mal comparar, mas orientar quem se interesse por essas coisas, eu suponho que os admiradores do CHICO BUARQUE, do MILTON NASCIMENTO ou do ROBERTO devam fugir disso aí.
Já se você gosta do CAETANO, do TOM Zé, do ARRIGO BARNABÉ e do HERMETO PASCOAL, tente ouvir.
O som é tão radical que malucos como eu e certos amigos, quando tomamos algumas juntos até colocamos discos de JAZZ FUSION e ROCK PROGRESSIVO. Mas, não me recordo de termos ouvido o FRANK ZAPPA – outro admirador de COLEMAN e também vida torta na música – porém, mais bem palatável…E isto dá uma dica do que estou dizendo…
Em poucas e finais provocações, se você gosta da ELIS REGINA fuja; se gosta da BJORK fique; se o seu maestro arranjador for o EDUARDO LAJE, então suma! E se for o GIL EVANS ou ROGÉRIO DUPRAT permaneça.
E quem gosta de arte de vanguarda, procure na internet o tinhoso acima. Fará um bem a si mesmo e abrirá algumas portas fechadas do céu – e do inferno, também.
Só que é dieta calórica demais e pode estragar paladares menos agressivos.
Tente!
POSTAGEM ORIGINAL: 13/06/2023
