CID FRANCO, PRISCILLA ERMELL E OUTROS RECALCITRANTES, INVENTIVOS OU SIMPLESMENTE EVAPORADOS

 

Eu sou recalcitrante.

E que porra é isso, tio Sérgio, seu “VAGO LUME DEAMBULANTE” ?

Nonada…quero dizer: porra nenhuma.

Tenho dificuldade em adequar-me; resisto a obedecer cegamente.

E gosto de um ritual: se os tempos vão à esquerda, eu os espreito à partir da direita, mas sem aderir plenamente a nada.

E vice-versa; porque o vício sempre versa… Tenho críticas quase sempre; e isto eu acho bom. Concordo comigo quase sempre.

Então, o TIO SÉRGIO aqui trouxe para vocês coisas um tanto quanto oblíquas que mantenho na discoteca.

Discos estranhos, entranhados em minh ‘alma, que estão comigo há anos. E a maioria permanecerá.

Será?

Eu garanto que são todos de alguma forma interessantes. Parte deles apenas pelo fato de existirem e trazerem um quê qualquer. Outros, porque feitos por gente criativa, não conformista e nem conformada. A maioria não é para ser ouvida direto, o tempo todo. E alguns, uma vez só já foi bom demais…

Vamos lá;

CID CAMPOS, filho do poeta AUGUSTO DE CAMPOS, músico e produtor, é culto e bem formado.

Ele saiu da turma do TEATRO LIRA PAULISTANA, em São Paulo, fábrica informal de contestações, propostas, ideias não alinhadas ao sistema, e que aconteceram no princípio dos 1980.

CID é da mesma geração de ARRIGO BARNABÉ, VANIA BASTOS, GRUPO RUMO, LÍNGUA DE TRAPO e etc…

“NO LAGO DO OLHO” saiu em 2001. Foi susto POP sofisticado. Por injunções imprescindíveis, também está na gravação ARNALDO ANTUNES. É garantia de boa poesia. E a produção do disco estava em dia com a vanguarda: instrumentação eletrônica e o vasto etc…. daqueles tempos.

Se cruzar com isto compre.

Eu conheci PRISCILLA ERMEL. Fomos rigorosamente contemporâneos na FFLCH da USP. Entramos em 1974 e nos formamos em 1979. Convivemos, mas nos falamos pouco. Eu estudava a noite e ela de tarde.

PRISCILLA é muito inteligente e criativa, e era muito querida pelos colegas. Ela se dirigiu prioritariamente para a ANTROPOLOGIA; e eu para a CIÊNCIA POLÍTICA.

Hoje, ela é pós doutora, dá aulas de ETNOMUSICOLOGIA, e sobre as várias integrações possíveis entre a antropologia, a música, e as artes visuais.

Além de textos acadêmicos, ela fez uma peça de teatro infantil, BOI BONIFÁCIO.

Gravou, também, discos do que hoje chamamos NEW AGE / WORLD MUSIC. Tudo bem pesquisado, interessante, bonito e musicalmente relevante.

Aqui, uma coletânea retirada de seus três primeiros LPs, lançada em 1994. Se encontrarem, não percam. Este ficará comigo para sempre. E espero um dia saber da PRISCILA, eu cruzarmos nas redes sociais.

Na linha de PRISCILLA, há o interessante disco de MAY EAST, ex-GANG 90 E ABSURDETES, grupo CULT formado por JÚLIO BARROSO em plena NEW WAVE pátria.

TABAPORA foi lançado pelo meu amigo@Rene Ferri em sua gravadora WOP BOP, em meados dos 1980.

MAY EAST “simplesmente” inventou a WORLD MUSIC!!!!Hoje, também tem vida acadêmica e é referência internacional em sustentabilidade.

A minha edição é de 2000, e vai continuar comigo. E, se encontrarem outra por aí, devorem. Não tenham pudores…

E mais três recalcitrantes:

MARCONI NOTARO, compositor, escritor e vida torta, fez esta pedra basilar do colecionismo, em 1973: NO SUB – REINO DOS METAZOÁRIOS”.

Está entre os discos que foram para o ralo, quando uma inundação destruiu a imensa maioria em estoque, no depósito da gravadora ROSEMBLIT, no Recife.

Inclusive o mítico PAEBIRU, de LULA CÔRTEZ e ZÉ RAMALHO.

MARCONI é alguma coisa tipo juntar RAUL SEIXAS com SAMBA “ANÁRQUICO”. O disco tem letras bem escritas e instigantes.

O vinil você não encontrará, e talvez nem este CD…É de coleção, mesmo.

WALTER FRANCO?

Bem, é WALTER FRANCO. O álbum “OU NÃO”, de 1973, traz CABEÇA, um “KRAUT talvez ROCK” totalmente experimental. Coisas também certamente

inspiradas pela obra de nossa “compositora-gênio alternativa”, JOCY DE OLIVEIRA.

“CABEÇA” foi vaiada pela turba “MPBÓIDE” radical, em um festival de música, no ano de 1972, aqui em PANDEBRAS.

Os alemães começaram com isso, pioneiros da música ELETROACÚSTICA, na década 1950, com STOCKHAUSEN e outros.

E, depois, com o KRAUTROCK no final da década de 1960, e hoje estilo consagrado e cheio de decendências e consequências. WALTER FRANCO trouxe para cá e CAETANO caiu de cabeça dentro da nova perspectiva por ele aberta., com ARAÇÁ AZUL, 1973.

É obra Imperdível e imperdoável!

Mais recente, outra gravação fora do óbvio. O encontro ao vivo, em 2015, de ARRIGO BARNABÉ, LUIZ TATIT e a cantora LÍVIA NESTROVSKY. E com tudo o que você tem direito em letras não convencionais, instrumentação experimental e estranhamento explícito.

É muito legal! Mas para poucos orgasmos. É conhecer, ter, e vez por outra retomar.

Favor não esquecer do verso definidor e definitivo em BABEL:

“Ser humano é tudo igual

É bem bom mas é falho;😀😀

Ser humano é cerebral

CEREBRAL, O CARALHO!”

Alguém duvida?

E vamos prosseguir;

FREE BOSSA é obra fora do esquadro do NOUVELLE… hã… CUISINE.

É disco criativo, mesclando eletrônica e instrumentos convencionais. Vai de “I LOVE YOU PORGY” a “MULHER RENDEIRA”. E passa por um delicioso quase hit recôndito: “SAIR DO AR”. Excelente!

NEYDE FRAGA?

Sim, “MAIS BALANÇO” é um disco mesclando SAMBA, BOSSA, SWING – JAZZ, e com direito a câmara de eco e reverberação em uma das músicas! É de 1965!!

Pois, é; por isso está na coleção.

MORENA BOSSA NOVA”, é de 2003. CLARA MORENO é filha de JOYCE E NELSON ANGELO, e fez disco agradável de NEW BOSSA dançável e moderninha. Mescla BOSSA NOVA com MÚSICA ELETRÔNICA. Dá festa!

Por falar em dançar, pulem com DAÚDE. “SIMBORA”, 1999, é TECHNO SAMBA-POP com PERCURSÃO AFROBAIANA.

Tudo junto, tio SÉRGIO? Será?

É.

Artefato excelente, anima qualquer rastapé; e é muito, mas muito mais legal do que IVETE SANGALO et caterva. DAÚDE é diferenciada.

Para encerrar, o BATACOTÔ, traz BRASILIDADES AFRO em música de primeira linha.

Estão no projeto os convidados DIONNE WARWICK, GILBERTO GIL, ERNIE WATTS, LENINE e o violinista JERRY GOODMAN, ex – MAHAVSHNU ORCHESTRA! Todos acompanham um grupo sui-generis em disco inusitado, sofisticado e algo difícil de encontrar.

Pra exemplificar a zoeira, um verso de “QUITAMBÔ”:

” No meio do mês de maio

É festa do véio laio

que inventou a gandaia

que toca tambô na praia

pra gente qui num trabaia

Pra gente da tua laia

Por isso é que nóis num faia…”

Se encontrar por aí vai ser baratinho. E num faia!

Mas, quem “faiou fui eu”. Acabei vendendo este exemplar e o disco da DAUDE…

Pois é, turma: postei verdadeira seleção de recalcitrantes e inesperados. Gente que disse “NÃO” para várias coisas. Mas, a caminho de um “SIM” muito mais interessante!

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