É comum eu escrever sobre certos músicos, músicas ou discos sobre os quais tenho a impressão de tocar a epiderme do acontecimento musical. E, por isso, de estar apenas no começo para compreender a profundidade da obra composta, ou executada à minha frente.
Tento acondicionar um presente para eu mesmo, e para o leitor. Procuro descrever percepções que não penetram na carne técnica de obras, cujas belezas muitas vezes recônditas, e outras explícitas, vêm com tal carga de sofisticação que exigiria, talvez, exegese para a qual não estou habilitado.
TIO SÉRGIO acha, no entanto, que o belo tem mais a ver com a melodia, sempre a cara do amor à primeira vista!
Claro, música é compósito de vários elementos: harmonia, ritmo, tempo, arranjos e vasto etc… Eu tento fugir do simplismo, mesmo alcançando pouco além do primeiro subsolo do encantamento.
TERJE RYPDAL quando criança estudou piano e instrumentos de sopro. Com o tempo, passou a tocar guitarra inspirado em HANK MARVIN, guitarrista dos SHADOWS.
RYPDAL passou há muito dos 70 anos de idade; portanto, é da mesma geração de CLAPTON, BECK, PAGE, HENDRIX, GILMOUR e ZAPPA. Ele é norueguês. Estudou musicologia e composição na UNIVERSIDADE DE OSLO. E dedicou-se, paulatinamente, à música de vanguarda em diversas vertentes.
O repertório estilístico de RYPDAL conjuga elementos do ROCK PROGRESSIVO, do FUSION JAZZ/ROCK, e principalmente, da MÚSICA CLÁSSICA e do JAZZ CONTEMPORÂNEO.
A geração de jazzistas e músicos clássicos de vanguarda, descendentes da música mais livre do final da década de 1950 em diante, foi se desenvolvendo no sentido da pesquisa de timbres, harmonias e ritmos elaborados.
É comum a proeza técnica sustentando um fascínio pelo “não melódico”, trazer resultados muitas vezes desagradáveis ( para o meu gosto, claro!!!). BRANFORD MARSALIS tem muito disso.
Eu percebo na música de TERJE RYPDAL uma inflexão nítida em direção à beleza melódica. Não é o belo convencional, e traz elementos da tradição. E tudo o que ele faz aponta para o agradável, o viajante, para um som bem cuidado e elegante – por assim dizer.
Seu trajeto artístico passou pelos grupos de GEORGE RUSSELL – pianista, compositor e professor americano, autor do primeiro MÉTODO DE HARMONIA BASEADO EM JAZZ, e não na MÚSICA EUROPEIA.
Estão postados aqui 4 CDS dos conjuntos de RUSSELL, gravados entre 1983 e 1985, onde TERJE e o saxofonista JAN GARBAREK tocaram com outros músicos da gravadora ECM.
Pesquisando pelaí, encontrei 47 discos de RYPDAL – ou com a sua participação. O primeiro deles para a POLYDOR, em 1968. Sua técnica e criatividade foi desenvolvida na gravadora alemã E.C.M, sob a direção do mago MANFRED EICHER. Aliás, o ambiente ideal a música sofisticada, viajante e não restrita a rótulos facilmente definíveis.
Por lá, TERJE participou em discos de GARBAREK, KETIL BYORNSTAD e JOHN SURMAN, pra ficar em poucos. E foi acompanhado por músicos em nível de MIROSLAV VITOUS, JACK DeJOHNETTE, JON CHRISTENSEN e ARILD ANDERSEN,! É a tal constatação imprecisa: “dize-me com quem andas, e eu te direi… Etc… e tal”!
Ao longo dos tempos, TERJE desenvolveu técnica para tocar longas notas delicadamente sustentadas; “sem ataque”. Se houver alguma comparação estilística e musical possível, TERJE RYPDAL “lembraria” DAVID GILMOUR, do PINK FLOYD. E, algumas vezes, JEFF BECK na fase BLOW BY BLOW.
Sua guitarra soa climática, melancólica, cerebral, nórdica e fria; sempre plena de estilo e imaginação. E está inserida no que se poderia chamar ‘EXPERIMENTAL MELÓDICO”…
TERJE cria uma FUSION DE VANGUARDA; ou como li, a “DISSOLUÇÃO DAS FRONTEIRAS ENTRE GÊNEROS MUSICAIS”, que aplica, também, em suas incursões na música clássica contemporânea:
“UNFINISHED HIGH BALLS”, composição dele, foi gravada ao VIVO , em 1976, com a SWEDISH RADIO JAZZ GROUP; e a sua ampla sessão de metais, abarca vários timbres e registros, além de melotron, celesta e percussão. É uma beleza, acredite.
TERJE RYPDAL compôs, inclusive, cinco sinfonias. Entre elas, MELODIC WARRIOR, gravada com o sensacional coro HILLIARD ENSEMBLE, e a BRUCKNER ORCHESTER LINZ, dirigidos por DENNIS RUSSELL. É o melhor disco que escutei em 2022!
Vou tentar descrever um pouco esta obra de arte. Eu adoraria “ver” como a partitura foi escrita; sua disposição interna, já que não sei ler música. É por causa da sonoridade complexa.
Gostaria de saber como se expõe, por escrito, uma “treta” daquelas! É um vasto BLEND que incorpora das “intenções” do ROCK PROGRESSIVO até as composições CLÁSSICAS ( ou ERUDITAS) de VANGUARDA!
A guitarra de TERJE RYPDAL se integra à escrita para CORAL e à ORQUESTRA, onde ficam evidentes a capacidade das vozes expressarem-se circundadas por esses dois meios (coral e orquestra).
Não é um DUELO, mas uma ARQUITETURA onde várias vozes simultâneas, e polifonicamente arranjadas, parecem afirmarem-se acima de qualquer possível criação instrumental.
O resultado é mágico!!! Extremamente belo!!!! Se é que bem compreendi; ou pude expressar através de palavras.
TERJE RYPDAL é um INTEGRADOR DE ESTILOS, um “DISSOLVEDOR DE FRONTEIRAS. Um grande artista suficientemente prolífico e instigante para deixar de ser notado.
Tentem! Já!
POSTAGEM ORIGINAL: 06/11/2022

POSTAGEM ORIGINAL: 06/11/2022
