Entre os fatos e coisas que me surpreendem, é constatar a tendência à atemporalidade, que a vida – artes incluídas – tomaram no mundo pós 1970.
A sensação é que tudo se transformou em um eterno presente. Principalmente, quando se fala de artes, e nem sempre por causa das obras em si que, em sua maioria, surgiram para ser consumidas no ato.
Perenidade é luxo. Geralmente existem apenas a criação, divulgação, acontecimento e fim. Arquiva-se e vamos para outra…
Porém, na sociedade contemporânea, com evolução da tecnologia, a massificação promovida pelo marketing, e à parte as qualidades intrínsecas da criação, a memória do acontecimento sempre pode ser recuperada.
E dela podem surgir outras fusões, entendimentos, suportes para além do imediato. É o “momento vindo do pretérito, e estendido no presente eterno imediato”…
Seria?
O ROCK, por exemplo, é pleno de “revivals”. Recuperações que podem trazer os ídolos do passado, assim como as influências deles nas propostas do presente.
Neste momento, artistas surgidos 45 anos atrás voltaram à tona. Mesmo que os melhores entre eles, portanto estendidos indefinidamente, jamais tenham saído do circuito.
Recentemente, vimos THE CURE, SIOUXIE & THE BANSHEES, PRETENDERS, em meio a vários, se apresentando renovados, mas incorporando estilos e técnicas da turma que os sucedeu, lá pelo início dos 1990. E isto fez e faz a diferença.
Quando houve o festival PRIMAVERA SOUNDS por aqui, em 2023, estava anunciado o inglês SLOWDIVE, grupo de certo prestígio, mas vendas pequenas. Eu gosto. Agora, postei os CDs que deles mantenho.
O grupo veio meio capenga, porque a vocalista principal, RACHEL GOSWELL, estava com problemas de saúde desde a passagem da “troupe” pelo CHILE, onde foram recebidos efusivamente!
Mesmo assim, RACHEL esteve nos palcos pilotando os teclados sem grande encantamento, mas provendo a “base bem anos 1990” que o grupo seguiu.
Eu assisti ao show no CHILE , via YOUTUBE. A qualidade técnica é ruim. Mas, fiquei surpreso quando soube que eles vinham se apresentando há muito tempo com repertório curto, insuficiente. A banda gravou pouco…Mas, permanece agitando…
Em linhas gerais, o SLOWDIVE é mistura do “DREAM POP”, com ênfase no vocal feminino, e “AMBIENT MUSIC”. E, quando estão no palco, “encenam” o …”SHOEGAZE”.
O efeito geral é belo e agradável.
Aprendi com meninos e meninas que trabalharam comigo na CITY MUSIC, uma das lojas que tive na década de 1990, sobre a mudança das perspectivas musicais nos 1980/1990.
O ROCK ALTERNATIVO, à época emergente, prescindia do virtuosismo egoísta. A música passara a ser interpretada como uma concepção de grupo. Coletiva; palavra que se instaurou, nas últimas décadas…
Mas, francamente, juntando os discos que tenho, o somatório daria um excelente álbum POP.
Um dos quase HITS do SLOWDIVE, ALLISON, tem melodia perfeita, linda! E, para mim, está entre as dez canções meio desconhecidas mais bonitas e viajantes do POP ROCK!
Em nível e companhia de “EXPECTING TO FLY”, 1967, música viajante e solitária de NEIL YOUNG, gravada pelo BUFFALO SPRINGFIELD; “JILL”, pepita psicodélica perfeita de GARY LEWIS & THE PLAYBOYS; e “PRETTY SONG OF PSICHED OUT”, outra beleza explícita feita pelos também americanos “STRAWBERRY ALARM CLOCK” – e ambas em 1968.
Porra!!!! ( hummm…), TIO SÉRGIO!!!! Estas são velhas demais!!!
Sim, e todas delicadas; e contendo o travo psicodélico “histórico” que perpassou os tempos…
O último disco que o SLOWDIVE lançou, EVERYTHING IS ALIVE, foi considerado entre os melhores de 2023… Não achei pra tanto, mas é bom; e reafirma o estilo…
Eles ganharam matéria destacada na imprensa inglesa, sublinhando a volta do “SHOEGAZE” à onda!!! Que, repetindo, é apenas uma postura da banda no palco: a turma toca baixo e guitarras olhando para os próprios sapatos, como se concentrada na execução da música… e que se tornou “estilo”, moda, no início da década de 1990!
RIDE, LUSH, SLOWDIVE, e uma penca neste “BRIT BOX”, tipo MY BLOOD VALENTINE, CURVE, PALE SAINTS, CATHERINE WHEEL, MOOSE, etc… se apresentavam desse jeito…e soam na mesma linha.
O som que produzem tem nada com esse “olhar cabisbaixo concentrado”, é claro! E ficou associado às bandas que focam nas guitarras pesadas, arranjos viajantes e vocais geralmente femininos e melódicos, ou seja, o DREAM POP… e suas variações.
Quem assistiu ao THE CURE, recentemente, observou que a turma das guitarras e baixo, estava “analisando os sapatos feito engraxates”… E criou um BLEND entre os ROCKS ALTERNATIVO e o PROGRESSIVO.
É a evolução sobre aquele passado de 45 anos atrás que retornou revigorada…
Procure ouvir.
