BJORK: AVENTURA SINGULAR DO GELO AO COSMOS

O Tio Sérgio aqui foi ótimo office boy.
E desde os 14 anos desenvolvi senso de direção, adquirido por resolvida intuição, e que me levava e trazia dos confins da cidade, de e até onde horizontes fossem vistos, buscando coisas, pacotes, processos, e o escambau determinado pelas secretárias da diretoria.
A remuneração, em um grande banco da época, o NOVO MUNDO, era um atentado aos direitos humanos. Eu ganhava, em 1967, o chamado “Salário Mínimo do Menor”. Metade do mínimo de um adulto, para trabalhar o dia inteiro, de segunda a sexta feira!!!!
Se hoje vivemos tempos de abusos, há 54 anos era “proto-escravidão” impingida.
Valeu a pena por um aspecto: eu girava São Paulo, vez por outra parava em lojas de discos, minha eterna paixão!
Mas, também fui péssimo jogador de futebol. Não tinha orientação espacial para jogar em espaços curtos, e muito menos habilidade motora para dribles, marcação, essas coisas que definem um garoto até, digamos, uns 16 anos.
Perdi um ano no antigo ginásio tentando aprender a jogar bola. Aprendi? Claro que não.
Então, fui mesmo em direção aos discos, e depois aos livros.
Acho que foi por isso tio Sérgio enxergou fácil BJORK, mas deixou de lado BRUCE SPRINGSTEEN – mais afeito à vida de garoto pobre em metrópole incipiente do terceiro mundo. Eu deveria ter estado mais para “BORN TO RUN”, do que para “HEART FULL OF SOUL”, dos YARDBIRDS. Mas, não foi.
BJORK, eu descobri no final dos anos 1980, com os SUGARCUBES, que pouco me diziam.
Mas, ela saiu do gelo para o mundo; olhar de laser, talvez lince, enxergou seu diferencial até agora não transposto: um cantar único auxiliado por um timbre soprano raro, mesclado com a estranheza do sotaque “islandês”, imposto como regra e não exceção. Entrou no mundo pop, submeteu-o, colocou-se.
Tio Sérgio, apesar da idade, tem o estranho orgulho de conhecer mais HITS da nórdica excêntrica do que do BRUCE SPRINGSTEEN.
E por que seria? Fácil. O americano é óbvio, mesmo que talentoso. Então, tio Sérgio atentou-se mais para ela.
A moça islandesa autotransplantada para o REINO UNIDO espanta! Como alguém vinda do gelo interessou-se por gente tão tropical como MILTON NASCIMENTO e ELIS REGINA, e convocou EUMIR DEODATO para produzi-la? E, talvez mais de seu tempo, incorporou e digeriu DJs do mundo inteiro para amplia-la? Pois, é!
E, pasme, como não se desfigurou sob influências tão exóticas? Eu não sei. Só sei que de alguma forma assimilou, foi em frente.
Você sabia que BJORK coleciona discos de ELIS REGINA? E que ISOBEL foi composta em homenagem a ela? Não notou? Não tem importância; mas, certamente, tem substância…
Ela é moderníssima, multiartista e multimídia. Quando assisti a “DANCING IN THE DARK”, filme do…ahnn psicopata LARS VON TRIERS, grande cineasta do mal – desculpem se não concordam -, fiquei mais fascinado ainda por ela. E principalmente pela crueldade do epílogo, em que acaba sendo executada injustamente por enforcamento. Está no filme CATHERINE DENEUVE – musa recorrente de minha adolescência anarcointelectualizada.
A reação que tive em seguida ao filme foi desfazer-me da trilha sonora, tal a repulsa por aquilo tudo! Não consegui escutar mais, ou sequer manter na coleção! Faltará sempre.
Conclusão lateral inescapável: BJORK é, além de grande, criativa, e sempre mutante compositora e arranjadora, uma ótima atriz! Conclusão lateral número dois: sou fascinado por VON TRIER, assisti e assisto a todos os filmes que ele faz; mas o quero preso em algum hospício. Ele não é humano.
Porém, BJORK é diferenciada. Não repete coisas; compõe melodias, todas dark, tristes, com síncope de filme de terror, e arranjos de mistério de filmes “noir”. Tudo o que faz é relevante e de qualidade artística indiscutível.
A voz de BJORK determina o andamento de suas músicas, é simbiótica às suas criações, composições, sei lá o quê! O senso melódico da moça é meticulosamente ajustado à sua voz e ideias. É única!
É minha opinião que DAVID SYLVIAN, BJORK e o RADIOHEAD são os mais importantes artistas de relevância da MÚSICA DE VANGUARDA, surgidos nos últimos 40 anos. Seriam?
Fui atrás do que pensam sobre a música dela. A quantidade de fusões que são nela identificadas é imensa, talvez a maior que vi por aí. Cito poucas: MÚSICA CONCEITUAL, TRIP-HOP, ETHEREAL, DREAM POP, e tantas mais e tão bonitas que tanto faz…
Nem vou concentrar-me em seus CONCERTOS! Diferentes, com banda organizando outras sonoridades; visualmente intrigante. Matador! É onde mais bem exerce o lado teatral, de atuação.
Como sempre, escrevo sobre impressões pessoais. São nove discos de estúdio, várias coletâneas. Muita gente estranha e nem tanto dela gosta.
BJORK é um pequeno gênio nórdico? Superdotada? Seguramente. Ah, sim! A hoje madura senhora é um sucesso também de público. Também por isso pouco tempo atrás, colocou à venda um apto, em Nova York, por $ 4,2 milhões dólares.
Saiu na RECORD COLLECTOR, que também baba-ovo por ela, como o tio Sérgio aqui.

Já deve ter sido vendido….

POSTAGEM ORIGINAL: 18/12/2020Nenhuma descrição de foto disponível.

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