Esse disco é a base do concerto que MILES DAVIS e banda fizeram quando passaram pelo Brasil pela segunda vez, em 1974.
Eu estava lá, no TEATRO MUNICIPAL DE SÃO PAULO, e vi aquele gênio original, ousado e vanguardista, tocando seu TROMPETE acoplado a uma pedaleira de guitarra, wah-wah, eco e tudo o que a tecnologia da época permitia!
Devastador!
Para um rocker como eu e amigos que estavam lá comigo, foi um bacanal sonoro iconoclasta.
Na metade da apresentação houve intervalo; e os mais velhos se retiraram protestando. Não era o MILES que por aqui estivera em fins dos anos 1950!
Ao contrário, havia aderido ao JAZZ FUSION. E trouxe uma banda jovem, com 3 guitarristas, baixo, bateria, dois percussionistas, e mais dois nos sopros. Foi tamanco sem couro: pau puro!
Quanto chegamos ao MUNICIPAL passamos por um preto magrinho e COOL, usando enorme echarpe; e postado nas escadarias fora do teatro. Era MILES DAVIS observando as potenciais vítimas ou futuros e reverentes cultores.
O que fizeram MILES e músicos é vanguarda até hoje, passados perto de 50 anos! Música livre, entrosada, mas sem roteiro muito definido. Na prática, um ROCK DA PESADA e sem piedade ou concessões. O concerto abalou o conservador, histórico e recatado principal teatro da cidade!
O repertório saiu pela primeira vez em disco no Japão, nos anos 1990 do século passado, após a morte de MILES DAVIS, em 1991. Depois, uma avalanche de discos inéditos, shows e vasto escambau foi despejado mundo afora!
Eu calculo que mais de 120 discos/CDs foram lançados ou relançados. Uma universidade sonora para estudo e curtição dos fãs, e todo o mundo.
Na edição limitada acima, o saxofonista e flautista DAVID LIEBMAN, que estava na banda, escreve um livreto expondo como o trabalho e os arranjos foram organizados.
Ele cita a criatividade, conhecimento musical e intuição de MILES DAVIS para fazer tocar a enorme máquina sonora que forjou. MILES dava organicidade ao caos domando a liberdade dos jovens músicos da banda.
Mas, não é disco para todos. É duro, multirrítmico, percussivo, e mescla o FREE JAZZ ao FUNK, algo entre SUN RA, JAMES BROWN e SLY & THE FAMILY STONE, em cima de um sub-reptício e recorrente ROCK (JAZZ?) MINIMALISTA.
E, claro, há os sopros, madeiras e metais, também nada convencionais. A começar por DAVIS, e sua engenhoca barulhenta: um trompete soando a galáxias do BE-BOP e de qualquer racionalidade tradicional!
Como disse um integrante da banda, à época, “MILES IS MILES AND MILES AWAY!” Um vulcão arrasador!
Verifique – se aguentar ou duvidar!!!! É para joviais e inconformistas. E, principalmente, para os que não perderam o humor e a curiosidade.
Original publicado em 04/02/2019
