Eu procurei, escarafunchei a minha discoteca atrás de dois discos seminais de WALTER FRANCO. Escafederam-se. Porra, TIO SÉRGIO, vai ser pernóstico e superado assim no QUIRGUISTÃO!
Agora, encontrei “OU NÃO” e “REVOLVER”; que talvez sejam mais pertinentes ao que escrevi, do que o “VELA ABERTA”.
Não à toa, WALTER FRANCO causava tumultos. Eram tempos de “suposta racionalidade explícita “, que vazava poros e mentes afora, e desembocava em política militante. Eu assisti a isto – estive por lá….
Era inadmissível alguém lúcido, à esquerda, consciente de Brasil e suas mazelas criar música e arte não engajadas! Questão de ética – imposta pela oposição à ditadura de 1964.
A música brasileira de qualidade, lá por 1972, estava dominada por CAETANO, CHICO, GIL e TOM JOBIM. É possível argumentar que o cenário pouco mudou. Mesmo com a falta de TOM.
Entraram outros diversos – o que é ótimo! Mas permanecem os mesmos, faz meio século e uns dez por cento de tempo a mais… E ainda com força! GILBERTO GIL, por exemplo, está na ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, e permanece astro onipresente, em ascensão imparável…
São quase seis décadas de um latifúndio produtivo bem cultivado, e politicamente correto. Mas, latifúndio ainda é. Muitos arranham, mas ninguém tasca!
WALTER FRANCO foi um radical. Desafiou isso tudo arquitetando experimentalismo sonoro deslavado, conjugado a letras repletas de sensações sobre o viver, e coisas não tão definidas. Nada é explícito em suas músicas perfeitamente compostas.
A poética de WALTER é construída em cima do que ele “sente” sobre o que pretende expressar. Falava e escreveu pouco. É sintético; e quem o escuta interpreta. E tenta desvendar a intenção .
Claro, isto incomoda – e muito! Porque não se coaduna à nossa cultura racionalista e verborrágica. WALTER era, delicadamente, o anti-DYLAN; o anti-CHICO; e o anti-GIL.
Talvez haja na música dele aspectos convergentes a CAETANO. Existe certo consenso de que o revolucionário e destemido ARAÇÁ AZUL, de 1973, em parte foi “desafiado” pela ousadia de WALTER, detonada por “CABEÇA”, em 1972.
Que o novo tenha prioridade, quem sabe tenha pensado CAETANO VELOSO, captando energias liberadas pelos CONCRETISTAS, a professora JOCY de OLIVEIRA, SMETAK, os TROPICALISTAS e o ROCK PROGRESSIVO, que já rolava solto. CAETANO reagiu rapidamente….
Eu sei, é “conversa de urubu” enfiada nesse texto, feito JABUTIS nos Projetos de lei do nosso CONGRESSO.
CABEÇA, é um misto de “KRAUTROCK ELETROACÚSTICO”, totalmente experimental, e MÚSICA e POESIA CONCRETA de verdade. Havia concorrido no F.IC. – SÉTIMO FESTIVAL INTERNACIONAL DA CANÇÃO, em 1972; onde WALTER encarou o auditório com atitude que misturava o “ZEN, o CONFORMADO e o CORAJOSO”. Esteve sob vaias, ameaças, apupos e adorações!
Depois, a obra foi incluída em “OU NÃO” álbum concebido em 1972, mas lançado em 1973.
CAETANO VELOSO é, também, um racionalista que sabe trabalhar com o sensível elaborado, e é menos conservador na forma do que os seus companheiros de geração.
Hoje, WALTER FRANCO certamente seria um anti-RAP e contra o falatório POP imperante na música.
A cultura brasileira é barulhenta demais para um sujeito reflexivo até quando faz um ROCK PESADO e incômodo.
Quando apresentou CANALHA, em outro FESTIVAL, na década de1980, causou reboliço, também!
ZIRALDO, o grande cartunista e artista gráfico, foi o excelente MESTRE DE CERIMÔNIAS. E quando foi anunciar, sorriu irreverente: “Xiiiiii, agora vamos ver o que acontece!!! Aqui, no palco, um iconoclasta único”!!!
CANALHA tem letra tão boa, sui-generis e impactante, que você a decora e viaja perseguindo e praguejando contra essa dor de alma indefinida, sorrateira, “mau caráter”, CANALHA! E, claro, é ROCK poderoso emulando FEITO GENTE, que abre REVOLVER, de 1972.
Eu me recordo quando entrei na FFLCH da USP, em 1974, e aconteceu um seminário com luminares da política, sociologia, artes, psicologia, etc… Foi um passaporte para outro universo ao mesmo tempo integrado e paralelo ao Brasil.
Quem falou de música, quase sob vaias, foi a jornalista e crítica ANA MARIA BAHIANA, detentora de legitimidade incontestável.
Questionada sobre censura e outras violências do regime militar, ela propôs: “se as palavras, e as letras das canções estão fragilizadas, censuradas, impedidas; então, por que não focar mais na construção da “música” para expressar o protesto?”
Imaginem o bacobufo que ela causou!!!!
Pedi, recentemente, para ficar amigo de ANA MARIA aqui nas redes sociais . Ela aceitou. Então, comentei o episódio, e se ela recordava aquele momento. Resposta precisa: “Eu não esqueço de nada”. Dou fé!
Então, se bem o interpreto, WALTER FRANCO fez isso: conjugou a experimentação sonora à não explicitude racionalista de suas mensagens. Viagens contínuas; recado passado; efeito retumbante – Inclusive politico!
WALTER FRANCO antecedeu a ARRIGO BARNABÉ, outra persona não grata e imprescindível! E ambos tornaram-se incômodos quase invisíveis, mas presentes e perceptíveis, …
Afinal de contas, nem a MÚSICA CONCRETA é tão palpável assim!
REVOLVER… OU NÃO?
POSTAGEM ORIGINAL: 23/11/2022

POSTAGEM ORIGINAL: 23/11/2022
