MEMÓRIAS DO CHILE, 1987!

 

Que feito extraordinário o desse menino eleito, BORIC!!! Fez 35 anos esses dias! Quase a metade da minha idade! É pouca vida e pouca experiência…

Elegeu-se pela esquerda. Alguns dizem que pela extrema esquerda. Eu duvido. Acho que não há espaço para qualquer tentativa não pactuada de virada de jogo no CHILE.

Haverá, espero, uma continuidade liberal-socialdemocrata. E mais aprofundada em direção à melhora nas questões sociais.

Os chilenos erraram na privatização da Previdência Social. Menos na teoria do que na prática. Mas, isto certamente será corrigido.

Nos dias de hoje, não é admissível que países ricos ou remediados deixem de tentar uma social democracia possível. O Brasil incluído!

E a existência de ensino superior público é outra exigência civilizada.

E por que, não?

Se for bem pensado, planejado e corretamente financiado, é possível, sim. Então, que venha fazer sombra à educação privada.

O CHILE reconstruiu-se pela via liberal e não esquerdista, com imenso sacrifício, mas grande proveito, também.

É o país da América Latina mais próximo do que se entende por primeiro mundo.

O país tem geografia estranha, curiosa. Mas, algumas vantagens comparativas imensas. Está de frente para o Oceano Pacífico, onde as grandes transformações geopolíticas estão acontecendo, nos últimos 40 anos. E continuarão irreversivelmente..

Os chilenos comerciam com o mundo inteiro. E direto com a Ásia e a Oceania, os grandes mercados da atualidade. Estão conseguindo fazer da circunstância geográfica um favorável instrumento geopolítico econômico – histórico.

E, gostemos ou não, o regime PINOCHET vislumbrou isso. Quando houve o golpe, em 1973, o governo “instaurador” rompeu com os soviéticos. Porém, manteve a parceria ativa com os comunistas chineses…

Ao contrário do Brasil, virado para o ATLÂNTICO e países pouco dinâmicos, o CHILE enturmou-se aos asiáticos, à Oceania, e com os EUA. E, também, com o polo dinâmico da América Latina.

Eles têm problemas. Mas, não se causam problemas, como o BRASIL e principalmatualmente a ARGENTINA fazem…

Eu e Angela, minha mulher, estivemos no CHILE em férias e a passeio, em 1987.

Mas, por que no CHILE?

Porque era o lugar mais longe que poderíamos imaginar, partindo de nossa grana curta e da geografia física que define o mundo.

Havia, também, angústia de ambos pelo violento e sanguinário golpe militar que os chilenos haviam sofrido. Então, fomos conhecer in loco! (Espero ir a CUBA antes que o socialismo acabe, e pelos mesmo motivos políticos).

A viagem é longa; na época era voo de quase 5 horas de São Paulo para SANTIAGO. Fomos, também, a VINHA DEL MAR. Curtimos 6 dias repletos de vivências. Momentos inesquecíveis e instrutivos. Voar sobre as cordilheiras é programa obrigatório para os curiosos.

Vou tentar descrever o que rolou.

Eu sou honesto, mas não sou imparcial. Mesmo porque a única atitude ética possível contra ditaduras e autoritarismos é a oposição decidida.

Odeio ditadores! Acho-os repulsivos política, existencial e moralmente. Então, censuro os progressos feitos às custas da democracia plena. Não valem a pena.

O CHILE é tão distante e inacessível, que sua vinicultura passou incólume por uma das mais devastadoras pandemias que assolaram as videiras, portanto a indústria do vinho: a PHYLLOXERA, no século XIX.

Se você quer ter uma ideia do que eram os vinhos franceses originais no final do século XIX, beba vinho chileno. Eles são os herdeiro das tradições vinícolas francesas…

Claro, nos fartamos de bons vinhos, inclusive fomos a um distribuidor local, compramos e trouxemos garrafas de bebidas de qualidade absolutamente acima das que, eventualmente, tomávamos no Brasil!

E adoramos os peixes, os “frios”, os embutidos, as frutas, os pães e as saladas! Eu gostei da cerveja, também!

A SANTIAGO de 36 anos atrás nos lembrou a RUA DIREITA e o CENTRO DE SÃO PAULO nos anos 1960.

Era cidade aprazível, e até bucólica. Hoje, ainda não sei.

Mas, havia cheiro de mudança, de renúncia extirpada a fórceps, daquele país digno e sofrido.

Claro, turistas não respiram o tempo todo angústias da atmosfera político-social!

Mas, podem perceber as marcas do fogo e do ferro que moldaram o CHILE naqueles tempos…

Nós dois sentimos a demolição à época em curso.

Como sempre fazíamos, pegamos um ônibus urbano e fomos até os confins da cidade. O ponto final era “LA BINCOYA”, tido como bairro violento, “terrible”, segundo o motorista do ônibus que nos levou. E, depois, nos trouxe de volta ao centro.

Francamente?

Achamos até tranquilo e organizado, com casas e conjuntos residenciais populares bem aceitáveis, se comparados ao que eu conhecia na zona Norte de São Paulo, onde trabalhei mais de vinte anos anos, no mercado imobiliário.

A VILA BRASILÂNDIA, e um bairro anexo chamado “ironicamente” de JARDIM PAULISTANO, eram muito piores…

E, mesmo refletindo sobre o que observamos lá, jamais imaginamos no que realmente o CHILE se tornaria! Mas, havia um odor de futuro melhor, sim.

Quando estivemos em SANTIAGO, os caras estavam em plena ditadura e com tudo o que uma ditadura gosta e oferece. Pinochet havia simplesmente esmagado a oposição. E a tal ponto que a “paz dos mortos” imperava nítida e audivelmente.

Eu e a Angela, andando a pé por SANTIAGO, cidade à época repleta de praças e recantos, e conseguimos chegar às portas do PALÁCIO DE LA MONEDA. E, pasmem, os guardas deixaram que nós adentrássemos alguns metros!!!

Mas, como?

Depois de 30 mil mortos, simplesmente não havia mais perigo para o regime….A tranquilidade urbana era paupável…

O entorno era assustador. O Palácio fica (ficava?) no centro de uma grande praça cercada por prédios residenciais, hotéis, empresas, etc… mas, de tal forma que está (estava) isolado e totalmente indefeso, se sob bombardeio aéreo. Alvo fácil!

Os relatos, na época, eram esses mesmos. O Palácio foi atacado, pela força aérea no dia do golpe, em setembro de 1973.

Foi parcialmente destruído. Um verdadeiro ataque terrorista em região populosa e absolutamente central da cidade! Um óbvio crime contra a humanidade!

Eu toquei em buracos de bala! Verdade.

A vida cultural era nula. Nítido e audível nulo.

A televisão estatal só exibia jogos passados de futebol, ou coisas inofensivas aos desígnios da ditadura vencedora.

A programação era encerrada muito cedo. Era recorrente, repetitiva.

Liberdades públicas? Nenhuma!

E o futebol? deixa prá lá…

Mas, naqueles dias, estava em cena o FESTIVAL DA CANÇÃO INTERNACIONAL DE VINHA DEL MAR! Um coletivo de breguices assustadoras, eventualmente secundadas por alguma contestação juvenil tímida, mal definida, cerceada por pudores impostos.

A censura era claramente total e obscurantista!

ROBERTO CARLOS esteve no tal festival, mas não vingou.

Venceu a representante da COLOMBIA cantando música inominável e inaceitável; total falta de sentido e de pertinência; uma completa ausência de porquê chamada LA GAVIOTA!!!! Os jornalistas locais urraram de orgasmo com a vitória de “LA HERMANA COLOMBIANA”!

A vida cultural não existia.

Mas, a vanguarda tecnológica já havia sido transplantada para lá. Sempre que viajo, gosto de ver sebos e livrarias, lojas de discos e de móveis. E, se possível casas, apartamentos e suas arquiteturas. São para nós dois diversão instrutiva e sociologicamente significativas.

Eu não consegui comprar um único LONG PLAY usado ou novo!!!!!! Encontrei apenas um do JEFFERSON AIRPLANE, totalmente destroçado…

Em 1989 os chilenos já estavam totalmente no CD! Quer dizer, haviam partido para ousar na modernidade. Coisa que o Brasil precisa urgentemente fazer em áreas diversas. Mas, claro, dentro da democracia e das liberdades públicas…

Vou tentar resumir o ambiente:

A destruição sócio-institucional do CHILE foi de tal forma violenta que, acho, Pinochet e seu regime conseguiram fazer uma “verdadeira e sangrenta revolução social e política”: mudaram a base e as estruturas da economia e da sociedade.

Não restou pedra sobre pedra; tradição partidária ou cultural.

A sequência dos governos democráticos foi totalmente inovadora e baseada, sem qualquer contestação, nesse outro CHILE reconstruído pelos militares.

Por mais que venham a investir no social, necessidade evidente e perfeitamente possível, os novos governantes não deverão aceitar violações nos pressupostos básicos da economia liberal: iniciativa privada, controle de gastos públicos, produtividade, integração aos mercados internacionai.

Eles não vão retornar ao passado, como está evidente na dificuldade que a sociedade tem tido para reformar a CONSTITUIÇÃO. Os chilenos perceberam as vantagens e os acertos de um conservadorismo não reacionário, mas cauteloso.

A construção de uma política econômica conservadora, mas do bem.

É isto o que BORIC herdou e vai tentar administrar. Torço por eles todos. Os chilenos merecem.

Veremos como será!

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