FRONTEIRAS ESTÉTICAS: MÚSICA PARA DIAS FRIOS EM TEMPOS ABRASIVOS. NICO, CARLY SIMON, JANIS SIEGEL E JONI MITCHELL

O tempo anda mais ou menos do jeito sombrio que, vez por outra, se reflete dentro mim: nublado; hoje, mais fresco, um quase frio, mas esquentando. O litoral norte paulista é assim no inverno.
A seca está pedindo chuva e, talvez, emulando as paragens nórdicas ou irlandesas, mesmo sendo no Guarujá de frente para o mar tropical.
Eu gosto disso. Prefiro mais do que os dias luminosos e bonitos.
O inverno é um “habitat” em que me dou bem. Acho convidativo à introspecção; mais adequado à reflexão contida, cautelosa e discreta.
No calor, eu tomo cervejas. No frio, também; mas alterno com vinhos. Sou amigo dos fermentados; evito destilados – alcoólicos demais para o meu gosto.
Parece que a indústria da música está encontrando jeito de sobreviver e ganhar dinheiro na era digital.
Há tempos, a bola da vez se tornou o “STREAMIN”, serviços que tocam e oferecem músicas a preços certamente possíveis e competitivos.
O som é o melhor possível!
Aliás, sem o artefato limitador, o COMPACT DISC, a música digital se expande, ganha contornos e qualidade jamais alcançados!
Goste-se ou não, a qualidade do som digital superou, há muito, o som do DISCO DE VINIL. Agora redivivo, ainda que para poucos. No entanto, ao contrário de minhas previsões e até vaticínios, leva jeito de permanecer.
Os taxistas ficaram em polvorosa por causa do Huber. Mas, pouca gente se importou com a derrocada em que entrou a indústria da música dos anos 1990 em diante. A culpa foi da pirataria, dos preços altos, e do MP3.
Uma parte importantíssima da indústria cultural foi à bancarrota; e teve de se reinventar na marra. Porém, a maioria do mundo gostou das novas tecnologias. E principalmente de saborear o delicioso trabalho dos artistas sem pagar.
Somos muito hipócritas, isto sim…
Bater bumbo, tocar guitarra, reger, compor, cantar produzir, investir, etc… não comove muita gente. Seria “não trabalho”; por isso teria de ser de graça…” um direito adquirido”…
Enquanto penso nisso, escutei três cantoras bastante diversas artística e existencialmente.
Vocês devem, e precisam conhecer o espetacular grupo vocal americano, THE MANHATTAN TRANSFER, de bastante sucesso dos anos 1980 e 1990.
Eles sempre cuidaram em alto nível da formação do repertório. Gravaram o fino da GRANDE CANÇÃO AMERICANA. E, também, artistas brasileiros de ponta como DJAVAN, IVAN LINS, MILTON NASCIMENTO, TOM JOBIM, entre vários.
O MANHATTAN TRANSFER fazia um delicioso, competente, e dançante JAZZ-POP.
Procurem ouvi-lo.
Uma das vocalistas, a excepcional JANIS SIEGEL, tem carreira solo independente – como todos eles, aliás -, e faz discos bonitos e sofisticados.
Mais uma vez, escutei o disco em que ela é acompanhada somente pelo pianista FRED HERSH: “SHORTY STORIES”, lançado em 1989 pela ATLANTIC RECORDS. O repertório de compositores atuais é fabuloso, sensível, irrepreensível.
Está no clima da época e ajuda espantar o horror que estamos enfrentando nesses dias politicamente cálidos e destrutivos.
Ouvi, também, um pouco de CARLY SIMON, e hoje gosto mais do que antes. Ela sempre me pareceu superficial em sua perene crise existencial de menina rica.
Agora, acho, encontrou sentido e nicho próprio no tempo e no espaço. Ouvi-la é delicioso; e compreendê-la talvez seja imprescindível. Ela canta o cotidiano da mulher urbana, liberada e autônoma.
De passagem, observo a foto da capa de “No Secrets”, que discretamente nos fazia imaginar, na década de 1970, o que JAMES TAYLOR desfrutara.
Hum… é humano, ué!
Existe aqui em PANDEBRAS, pequeno BOX com os 5 primeiros CDs de CARLY. Foi barato quando lançado, e permanece muito agradável e recomendável para os mais adultos.
Então, emendei para JONI MITCHELL, minha cantora e artista múltipla predileta, em seu queixoso, lúgubre e solitário clássico pleno de D.Rs.
“BLUE”, lançado em 1971, é obra de arte explícita. Obrigatória para quem gosta de boa música.
Depois, adentrei o portal cósmico para o suicídio virtual.
Tomei nave direto para o BOX com os dois gélidos CDS cometidos por NICO, entre 1968 e 1970: THE FROZEN BORDERLINE, que traz “The MARBLE INDEX” e ” DESERT SHORE”.
Pois, é!
O que vocês acham da seguinte frase: “Esse disco é um artefato, e não uma mercadoria. Você não pode vender suicídio!… É JOHN CALE, parceiro de LOU REED, no VELVET UNDERGROUND, comentando a respeito do LP “The Marble Index”…
Na mosca! Ou na lápide?
NICO é um caso à parte na história do ROCK! Voz cavernosa e comportamento digno de admiração e concordância por sua companheira de geração, a inglesa MARIANNE FAITHFULL.
Ou seja, são duas artistas claramente autodestrutivas. MARIANNE, quando jovem, namorava e se drogava com KEITH RICHARDS.
E, se você já ouviu falar de SYD VICIOUS e NANCY LAURA SPUNGEN, agora acabei de apresentar o modelo acabado seguido pelos dois….
Alemã, bonita, e modelo na FACTORY, de ANDY WARHOL, a notória NICO participou do CULT e seminal primeiro disco do VELVET UNDERGROUND, “cometido” em 1966.
Bem, se você pensa que a segunda metade anos 1960 foi um período só de alegria inconsequente, cheio de perspectivas otimistas; coalhado de HIPPIES, e pelo SUNSHINE POP de grupos como MAMAS & THE PAPAS, 5TH DIMENSION, THE ASSOCIATION… é porque não assistiu “ERA UMA VEZ EM HOLLYWOOD”, de QUENTIN TARANTINO…
E não escutou o VELVET UNDERGROUD e a NICO.
Eles formaram a outra vertente que influenciou o futuro. São de certa forma ancestrais de ALICE COOPER, IGGY POP, STOOGES, DAVID BOWIE. E o espírito ancestral de bandas góticas como SIOUXIE and the BANSHEES, THE CURE, FIELDS OF THE NEPHLIN, ou JOY DIVISION…
Se refinarmos um pouco mais, até de niilistas como LEONARD COHEN…
Alguns discos dessa gente lembram as trilhas sonoras de filmes de terror; BORIS KARLOFF, ou NOSFERATU.
Ouvir NICO, MARIANNE e o VELVET UNDERGROUD nesses tempos abrasivos, é um jeito de pavimentar caminhos para o cemitério ou a depressão.
Mas, há consolo sublime: eles também enriquecem esteticamente o presente desesperador que observamos e vivemos…
Dias e tempos melhores certamente chegarão.
Veremos?
POSTAGEM ORIGINAL: 12/09/2021
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