O ACASO É UM GRANDE CONSTRUTOR DE MUNDOS, MITOS E VIDAS.
O fundador ou primeiro catalizador do BRITISH BLUES, portanto um dos “irresponsáveis” pelo ROCK MODERNO, nasceu em PARIS, em 1928.
Foi por acaso, também. ALEXIS ANDREW NICHOLAS KOERNER, era filho de mãe GRECO-TURCA (PASMEM!!!), e pai AUSTRÍACO descendente de aristocratas russos. A família girou pela Europa, após a primeira guerra mundial, até fixar-se em LONDRES.
ALEXIS era tido como superdotado, indisciplinado, e com problemas mentais. Foi expulso de escolas, e aprendeu sozinho a tocar violão e ukelele.
Dia incerto, começou a praticar no piano da família. Era “BOOGIE – WOOGIE”. O pai bateu “a tampa” e trancou o instrumento, proibindo ALEXIS de tocar “aquele tipo de música”. Mas, não adiantou muito. Ele foi tocar guitarra e continuou subvertendo valores … KORNER era, antes de tudo, ativo e determinado. Basta passar a vista em sua carreira para concluir.
Em 1947, ele já tocava semiprofissionalmente, e colecionava discos de JAZZ. Fez o serviço militar na ALEMANHA, onde enturmou-se com os americanos e os discos que eles traziam de casa.. Apaixonou-se pelo BLUES ACÚSTICO depois de assistir a um concerto do cantor FOLK-BLUES americano LEADBELLY. Foi em Paris, 1949.
Nas décadas de 1940 a 1960, a FRANÇA foi lar para grandes músicos que o mundo e a vida exilou . Os franceses estavam muito influenciados pelo JAZZ e a BLACK MUSIC AMERICANA. A discografia de JAZZ lançada ou produzida neste período naquele país, é grandiosa e culturalmente importante.
Quando saiu das forças armadas, ALEXIS KORNER caiu direto na música. Sua primeira gravação conhecida é de 1954, como parte do KEN COLLIER SKIFFLE GROUP.
Aliás, o SKIFFLE era a grande sensação da música popular inglesa, no início dos 1950. Um “blend” feito por “JAZZ+BLUES+FOLK +REGTIME”, tocado com instrumentos acústicos e “WASHBORD” – a popular tábua de lavar roupa.
Em 1956, havia bares e clubes especializados no gênero espalhados pela Inglaterra. Foi em um deles, onde ALEXIS e CYRIL DAVIES, também cantor, guitarrista e gaitista se conheceram e perceberam afinidades.
CYRIL, “O ARQUITETO DO BRITISH BLUES”, era proprietário do ROUNDHOUSE, um PUB no SOHO londrino. E propôs a ALEXIS fechar o PUB, reformar o local e sair direto para o BLUES, deixando o SKIFFLE de lado. Fizeram. Virou HISTÓRIA.
Na inauguração do “LONDON BLUES & BARRELL HOUSE CLUB” apenas 3 gatos molhados apareceram; e a coisa não engrenou muito bem. No entanto, lá foi concebido o disco que sintetizou a primeira experiência que desaguou no BRITISH BLUES:
O histórico BLUES FROM ROUDHOUSE do “ALEX KORNER´S BREAKDOWN GROUP featuring CYRIL DAVIS” ( escrito errado mesmo ), foi gravado em 1957, na minúscula “77 RECORDS”. É Long Playing de dez polegadas e 8 músicas. Foram prensadas somente 99 cópias, o padrão inglês para que ficassem isentas de impostos.
Pois bem, meninos, meninas e adjacências que pretendam colecionar: este é o disco a ser buscado! É o “CHEGA DE SAUDADES”, do moderno “BLUES-ROCK” inglês! Só que podem esquecer: existem algumas cópias do original em mãos de grandes colecionadores e custam o terceiro olho. Nem é cotado em revistas especializadas…
A minha edição em compact disc traz o disco original e mais os dois outros EPs., lançados posteriormente pela DECCA RECORDS, e também impossíveis de serem conseguidos. Complementam o CD as gravações de KORNER com o KEN COLLIER SKIFFLE GROUP.
A História é longa; e, aqui faço apenas uma introdução…
O BLUES pegou mesmo na Inglaterra, depois que MUDDY WATERS fez histórica performance por lá, em 1958, apresentando o ELECTRIC BLUES DE CHICAGO. Até 1961, o JAZZ dominava quase totalmente as noites inglesas. Mas, aos poucos, foi sendo solapado. E o motivo é nítido! O BLUES ELÉTRICO era muito mais afeito aos jovens, já inebriados pelo ROCK AND ROLL e o POP crescentes. E, é bom para tomar cervejas, curtir em grupo, dançar, essas coisas…
Então, ALEXIS KORNER abriu o EALING RHYTHM AND BLUES CLUB, e não deu outra: o BLUES, já destacado do JAZZ, pegou de vez.
O ALEXIS KORNER´S BLUES INCORPORATED que abriu a primeira noite, em 17/03/1962 trouxe CHARLIE WATTS, na bateria – ahhh, vocês sabem quem é; KORNER, guitarra, CYRYL DAVIES, harmônica; e o vocal de ART WOOD, irmão de RON WOOD, dos STONES.
Para iluminar a estrada imensa, eis alguns memoráveis que passaram pela banda naqueles tempos: ERIC BURDON, GINGER BAKER, JACK BRUCE, DAVE GRAHAN, JOHN SURMAN… E surgiu o tsunami que revelou e arrastou bandas como os ROLLING STONES, ANIMALS, YARDBIRDS, JOHN MAYALL`S BLUESBREAKERS, MANFRED MANN, e tantos e tão variados que é impossível de serem totalmente citados!
O seminal “R&B FROM THE MARQUEE”, do ALEXIS KORNER´S BLUES INCORPORATED, foi gravado ao vivo por insistência de JACK GOOD, produtor e homem de televisão. Só que a contragosto da gravadora DECCA. E foi lançado em novembro de 1962.
Vocês certamente se lembram que a DECCA também rejeitara os BEATLES… Então, dá pra arriscar que eles estavam, mesmo, “por fora”, como se dizia por aqui, na década de 1960/70… Claro, a gravadora não promoveu o disco, que era vendido a preços de liquidação antes de firmar-se cult e colecionável.
No entanto, exemplifica muito bem o BLUES BOOM, que juntamente com a nova música BEAT assolaram a Inglaterra… e depois o mundo!
A edição original do álbum é, hoje, raríssima e ultra colecionável! Alguma dúvida? E traz músicos históricos e artisticamente profícuos. Estão ali o saxofonista DICK HECKSTALL-SMITH; na harmônica CYRIL DAVIES, também revezando o vocal com LONG “JOHN” BALDRY – de quem ELTON JOHN pinçou o nome artístico; e o baixista DANNY THOMPSON – enorme na cena inglesa, e fundador do PENTANGLE, grupo espetacular que executa uma FUSION entre o FOLK e o JAZZ . É suficiente?
Se eu tivesse de escolher alguns discos entre os muitos que KORNER gravou, ficaria com este; e principalmente “ALEXIS KORNER ALL STAR´S BLUES INCORPORATED”, lançado em 1964.
Mas TIO SÉRGIO, por que?
É a síntese do “principal rumo” que ALEXIS pretendeu dar à sua obra: o encontro do JAZZ com o BLUES; ênfase nos metais, muito ritmo, e principalmente o gosto de modernidade que seus discípulos – os nossos ídolos dos anos 1960! – escutavam nas baladas, clubes e pubs que frequentavam: é a fusão animada e dançável entre o JAZZ e o R&B, coalhada por BLUES e retro gosto de ROCK AND ROLL!
A receita base foi seguida, entre vários, por GRAHAN BOND ORGANIZATION ( JACK BRUCE+GINGER BAKER+JOHN McLAUGHLIN… ); GEORGIE FAME & THE BLUE FLAMES; e ZOOT MONEY BIG ROLL BAND. E, principalmente, pelo maior de todos, JOHN MAYALL’S BLUESBREAKERS – também descoberto e trazido à cena por ALEXIS KORNER.
Todos foram inspirados em jazzistas americanos, como JIMMY SMITH, RAY CHARLES, LOU DONALDSON, e tantos e tão variados. Além, “por supuesto” de BLUESMEN da estirpe de B.B.KING, SONNY BOY WILLIANS, JOHN LEE HOOKER, e não restrito etc….
E tudo desaguou no estuário do ROCK moderno.
Não à toa infinidade de outros britânicos, alguns eminentes ou evidentes, como NICK HOPKINS, ROBERT PLANT, MICK JAGGER, PAUL JONES ( vocalista do MANFRED MANN, etc… ), MIKE PATTO, KEITH RICHARDS, STEVE MARRIOTT… de um jeito ou de outro cruzaram a carreira de ALEXIS.
Em 1970 KORNER, já amplamente reconhecido, teve algum sucesso com o C.C.S. ( COLLECTIVE CONSCIOUSNESS SOCIETY ), em versão bem legal de WHOLE LOTTA LOVE, do LED ZEPPELIN. O disco também saiu no BRASIL.
Porém, o mais inusitado talvez tenha sido o SNAPE, grupo juntado por ALEXIS KORNER para acompanha-lo, em 1972. Nada menos que gente saída do KING CRIMSON: MEL COLLINS, IAN WALLACE e BOZ BURRELL… Vai entender as “FUSIONS” que o nosso “francês” quase fake prospectava!
ALEXIS KORNER, de quem tenho poucos discos, continuou gravando e “deambulando” por aí. Morreu em 1984. E CYRIL DAVIES, o arquiteto do BRITISH BLUES, também gravou pouco. Morreu de Leucemia, em 1964. Mas, é impossível esquecê-lo porque imprescindível coadjuvante na criação do BLUES nas terras do REI CHARLES – não confundir com o grandíssimo cantor, claro!
A coletânea PREACHIN´ THE BLUES colige tudo o que ele fez. É notável a participação do CYRIL DAVIES ALL STAR, em algumas faixas de uma série de LPS chamados BLUES ANYTIME, organizados, em 1966, por MIKE VERNON, para a cult BLUE HORIZON RECORDS.
Curiosamente, dois álbuns duplos, juntando os 4 Long Plays originais, foram lançados por aqui pelo selo ELDORADO, no início dos anos 1990. Meu amigo
Ayrton Mugnaini Jr., traduziu e complementou o texto! São álbuns imperdíveis! Tente acha-los; porque aulas magnas de história do BRITISH BLUES.
Outra coisa, TIO SÉRGIO, que “eu não entendeu”:
por que estão na foto esses discos: VAN MORRISON, THE SKIFFLE SESSIONS, com LONNIE DONEGAN & CHRIS BARBER, lançado de 2000? E o DICK HECKSTALL-SMITH AND FRIENDS, BLUES & BEYOND, lançado em 2001?
Seguinte, sobrinhos and beyond: porque exemplos modernos do que é o SKIFFLE. E ALEXIS ANDREW NICHOLAS KOERNER substituiu LONNIE DONEGAN, guitarrista, no grupo de CHRIS BARBER, trombonista e baixista, no início da década de 1950. A conexão é histórica!
E o DICK está na origem e sequência da carreira de ALEXIS, “et MONDO” no BRITISH BLUES!!! Ahh! observem quem está com ele: PETE BROWN, JACK BRUCE, CLEM CLEMPSON, PETER GREEN, MAYALL, MICK TAYLOR e outros! São mais dois disquinhos pra vocês procurarem!
Procurem conhecer os discos do “MITO” (oooopaahhh, não aquele que vocês já imaginaram) !!!! “”.
Por aqui, eu demonstrei o “RITO”. Esfalfem-se, e consigam o ALEXIS KORNER!!!!
POSTAGEM ORIGINAL: 17/07/2023
