JEFF BECK – PARTE 2 : FUSION & BEYOND – INFLUÊNCIAS & CONFLUÊNCIAS

JEFF BECK, à partir de 1972, pôs-se na confluência de várias ideias e vastos dilemas. Ele jamais foi um atleta da guitarra, alguém interessado em performances virtuosísticas.

Ao contrário, sempre foi refinado melodista, cultor das sutilezas do toque, da expressão nítida e sem exagero. Daí, a paixão pelo R&B, SOUL, BLUES e, em doses reduzidas, até algo de MÚSICA CLÁSSICA.

E, também, autocriticou-se com certo pudor e restrição ao que fez com BOGERT & APPICE, 1972/1973 onde, limitados pela ausência de um cantor adequado, os três partiram em direção ao quase “atletismo”.

A torcida adorou! Muita gente aprecia ainda hoje, principalmente o duplo LIVE NO JAPÃO, mas…

Os caminhos de BECK, um inovador, não estão próximos de SATRIANI, VAN HALEN, VAI, MALMSTEEN, músicos técnicos, exibicionistas e performáticos.

JEFF BECK é essencialmente um guitarrista clássico e inteligível. O que não significa desprezo pela inovação, vanguardas, e o diferente desafiador.

Ao contrário: ele apenas usa tecnologias e o novo como expansão dos limites, e sempre dentro e a favor do musical identificável.

Na pauta perene de alguém sempre na vanguarda, como ele, resvalando rupturas e as fronteiras em diversos momentos da carreira, JEFF BECK sempre soube dosar ousadias sem perder a essência de seu estilo. Ele sempre esteve na moda.

A ideia de FUSION é abrangente demais para ser rapidamente resumida.

Pode-se entrevê-la desde o surgimento da BOSSA NOVA, no cenário internacional, no final dos anos 1950. Afinal de contas, JOÃO GILBERTO e TOM JOBIM SÃO O QUÊ?

FUSION, é claro!

E aprofundou-se em meados da década de 1960, quando grandes nomes do JAZZ toparam fazer discos de covers de música POP mais conhecida. Os músicos, claro, precisavam sobreviver. E muitos gravaram tocando de maneira simplificada, LOUNGE, e o resultado foi palatável, mas nada lisonjeiro.

Um exemplo que jamais esqueço, é disco de WES MONTGOMERY tocando com toda sua técnica “CALIFORNIA DREAMING”, hit dos MAMAS & THE PAPAS. Disco agradável, e medíocre.

O JAZZ estava em crise!

A FUSION foi tentada por vários grupos de ROCK. O TRAFFIC, por exemplo, em álbuns como “JOHN BARLEYCORN MUST DIE”, 1970, em que fundem JAZZ e BLUES, mas pela ótica do ROCK.

Experiência bem sucedida que os levou a “LOW SPARK OF HIGH HILLING BOYS”, 1971, um clássico daqueles tempos.

Porém e certamente, o marco inicial do FUSION JAZZ, como em geral o percebemos, foi determinado pelo trompete de MILES DAVIS.”IN A SILENT WAY”, 1969, é obra magnífica com os tecladistas JOE ZAWINULL e CHICK COREA; JACK DeJOHNNETE, na bateria; e DAVID HOLLAND, no baixo.

Mas, é a a participação definidora de outro talentoso guitarrista inglês, JOHN McLAUGHLIN, antecipando em quase três anos a performance que inspirará JEFF BECK em “MAX´TUNES ou RHEYNES PARK BLUES”, do álbum “ROUGHS AND READY”, de 1971.Esta é a primeira faixa realmente FUSION JAZZ que JEFF BECK gravou. E dá charme a um disco repleto de R&B e SOUL, já inclinado para o futuro.

É, também, a gênese e inspiração para a sonoridade desenvolvida pela gravadora ECM e seus guitarristas, como PAT METHENY, TERJE RYPDAL, e incontáveis outros músicos desse JAZZ climático, frio, sofisticado e moderníssimo.

JEFF BECK não criou o conceito de FUSION para a guitarra. Mas, expandiu suas fronteiras com técnica e sonoridade únicas. Com dificuldades para encontrar o vocalista ideal, aos poucos ele foi dirigindo seus discos para o INSTRUMENTAL.

BECK deve ter notado que, lá por 1971 em diante, um grupo holandês fazia muito sucesso naquela fronteira que, por muito pouco, separa a FUSION do PROGRESSIVO. O FOCUS não usava vocalistas, e tinha o excelente guitarrista JAN ACKERMANN, um link entre os dois estilos, o que certamente acendeu luzes dos profissionais para essa hipótese.

Foi nesse mezzo lusco-fusco que o histórico produtor GEORGE MARTIN, que trouxe os BEATLES e depois outros para a relevância artística, entrou na parada.

Ele digamos “aliviou e sutilizou” o toque de JEFF BECK, na guitarra. E o aproximou ao “JAZZÍSTICO”, digamos. E às “baladas” POP sofisticadas. E BLOW BY BLOW, 1975, tornou-se um clássico da FUSION, aproveitando o talento e proficiência do pianista e tecladista MAX MIDLETTON, já revelada em discos anteriores e também expressa nos posteriores.

Que pena MIDLETTON não ter vindo com MICK TAYLOR ao BRASIL!!!!

“BLOW BY BLOW Foi o míssil sonoro que relançou o guitarrista para o futuro transformado em presente quase eterno. BECK TORNOU-SE CONTEMPORÂNEO ATÉ MORRER!!!!

JEFF BECK observou e sintetizou ideias que JOHN McLAUGHLIN desenvolvia com a MAHAVISHNU ORCHESTRA, colegas na COLUMBIA RECORDS, e onde brilhava um tecladista visionário e criativo:

JAN HAMMER, depois seu parceiro nos discos fundamentais “THERE AND BECK”, 1980; “WIRED”, 1976; e JEFF BECK & JAN HAMMER GROUP, 1977.

Ambos criaram a simbiose da guitarra vívida de JEFF com o ELETRÔNICO DE VANGUARDA, que se estabelecia na música no começo da década de 1980, e passou a dominar cenário. E até hoje…

É crer, ouvir, e concluir!

PÉROLAS AOS PORCOS DE TOM RAPP – MARCO ANTONIO GASPARI

TRANSCREVO AQUI O TEXTO DE MEU AMIGO Marco Antonio Gaspari também sobre TOM RAPP e o PEARL BEFORE SWINE. Acho que, no Brasil, apenas eu e ele escrevemos sobre os dois!!

Foi um acaso feliz, em cima de assunto raro, com poucas fontes de informação original, mas nós dois conhecíamos os discos e tivemos motivações para escrever! São perspectivas diferentes, e complementares. Por isso, é pertinente e justo manter o que ele escreveu muito bem!

A safra de LSD produzida e distribuída por Owsley Stanley em São Francisco naquele ano de 1967 devia ser das melhores, porque os freaks da cidade simplesmente alucinaram quando viram nas lojas aquele disco incomum, cuja capa mostrava um detalhe do quadro “O Jardim das Delícias” do pintor flamengo Hyeronimus Bosch.

O nome do disco era “One Nation Underground”, estréia da banda Pearls Before Swine, que na contracapa não fornecia nada mais além das letras de algumas músicas. Nada de ficha técnica, nada de foto da banda, um mistério que só serviu para alimentar as especulações da população hippie que já havia chapado com o último disco dos Beatles:

Sargeant Pepper’s Lonely Hearts Club Band.

Como o som era algo que hoje podemos rotular de acid folk melódico, e os arranjos traziam exóticos instrumentos árabes e asiáticos sobre um Farfisa garageiro, o cérebro fritado em banha ácida da comunidade hippie começou a viajar e boatos foram levantados de que aquele disco deveria ser uma não creditada parceria entre ninguém menos do que Bob Dylan e os Beatles.

Bom, as letras eram originais, poéticas, desarticuladas e longe do estilo dylanesco, o que não impediu que justificassem como letras de outra pessoa na voz de Mr. Zymmerman. E quanto aos arranjos sofisticados, eles até que tinham um pedigree que se encaixava na árvore genealógica dos rapazes de Liverpool, mas a viagem não acabava por aí. A alucinação bateu forte por causa do selo que lançou o disco: o novaiorquino ESP Records, com certeza o selo mais anticomercial daquela época, que já havia lançado dois discos da banda The Fugs e vários álbuns experimentais de free jazz. Se dois dos maiores expoentes da música jovem de então quisessem documentar uma parceria e escapar dos problemas contratuais com suas gravadoras, nada melhor do que um disco fantasma lançado pelo mais underground dos selos. Na cabeça de todo pirado que habitasse entre o distrito de Haigh-Ashbury, em São Francisco, e o bairro do SoHo, em Nova York, tudo se encaixava e “One Nation Underground” vendeu na época cerca de 200.000 unidades. É até hoje o disco mais vendido da história da ESP Records.

No ano seguinte, um novo disco do Pearls Before Swine, tão bom quanto o primeiro, aterrissou nas lojas: “Balaklava”. Desta vez, o disco trazia na capa uma pintura do também pintor flamengo Pieter Bruegel (o velho) chamada “O Triunfo da Morte”; e não por acaso, Bruegel tinha Bosch como uma de suas principais influências. Aqui o PBS revela não apenas sua temática “anti-war” como também todo o seu mistério para aqueles que não se deram ao trabalho de ler resenhas sobre o primeiro disco nas revistas da época, já que traz uma foto da banda na contracapa e o nome de seus integrantes.

Para ser sincero, não sei se é correto chamar o PBS de banda. Estava mais para um projeto de um jovem e brilhante músico, autor de muitas das letras mais poéticas e surrealistas dos anos 60, chamado Tom Rapp. Tom nasceu na cidade de Bottineau, Dakota do Norte, quase na fronteira com o Canadá, e cresceu em Minnesota, onde foi muito influenciado pelos músicos de country e folk locais. Seu estalo para a música, porém, aconteceu quando ouviu no rádio Peter, Paul and Mary tocando “Blowing In The Wind”. Resolveu aprender a tocar a música imediatamente e, quando soube que era de Bob Dylan, interessou-se pelo compositor e passou também a compor. Espécie de autodidata, Tom aprendeu tudo o que sabia sobre tocar um instrumento nas folhas de um song book de Joan Baez. Junto com três amigos da escola onde fazia o colegial em Melbourne, na Flórida, formou uma banda (Wayne Harley no banjo e bandolin, Lane Lederer no baixo e guitarra e Roger Crissinger nos teclados) e gravou uma fita demo que foi enviada à ESP Records. Imediatamente foram convidados a gravar um álbum.

Essa tal de ESP Records foi a primeira gravadora dedicada quase que exclusivamente à música underground. Pertencia a um advogado do ramo musical de nome Bernard Stollman e foi fundada em 1963 na cidade de Nova York com o nome de Esperanto Disk, cuja especialidade era gravar LPs nessa língua universal. Quando encurtou o nome da gravadora para ESP, Stollman passou a oferecer, podemos dizer, a única oportunidade para músicos de jazz de vanguarda, folk-rock boêmio e colagens experimentais gravarem um disco. Graças a esse espírito pouco convencional e alheio ao mainstrem, a ESP lançou discos de Sun Ra, Pharoah Sanders, Paul Blee, The Fugs e Holy Modal Rounders, entre outros alucinados. Também tinha parte de seu catálogo dedicado ao que hoje chamamos de World Music, com discos de música regional de vários países.

Aliás, isso explica a sonoridade medieval e os instrumentos exóticos do primeiro disco do PSB. Quando Tom Rapp e cia. entraram no estúdio da ESP em Nova York, encontraram vários instrumentos das bandas étnicas que gravavam por lá. Como a gravadora cedia apenas o estúdio, sem ter um produtor ou engenheiro de som, as bandas usavam seu tempo como queriam e o PSB se sentiu à vontade para tirar um som dos sarangis, ouds (espécie de balalaika) e osciladores que estavam dando sopa.

O sucesso de Balaklava, tanto de público quanto de crítica, acabou animando Bernard Stollman a oferecer uma compensação financeira a Tom Rapp, mas imagino que não deva ter sido muito boa pois já li algumas entrevistas do artista dizendo que ele não fez dinheiro algum com esses discos.

Balaklava também marca o final da carreira do Pearls Before Swine como grupo, pois os três amigos de Rapp debandaram logo após e ele continuou como artista solo, mas usando ainda o nome do PBS. Lançou 5 discos pela Warner/Reprise e 2 pela Blue Thumb até 1973.

Em 1976, finalmente caiu a ficha de que, apesar de ter gravado quase uma dezena de LPs, lançado vários compactos, feito vários shows e conquistado um certo reconhecimento da crítica especializada, não valia mais a pena para um artista com tão pouco apelo comercial como ele viver quebrado financeiramente. Rapp então abandonou a música e voltou a estudar, formando-se em economia e advocacia.

Em 1995, após aceitar um convite do fanzine Ptolomaic Terrascope, apresentou-se ao vivo junto com seu filho David e pode constatar que sua música havia influenciado vários novos artistas. Muitos deles, inclusive, gravaram um CD tributo ao Perls Before Swine em 1997.

Vou finalizar com um trecho de uma entrevista de Rapp à Revista Goldmine de outubro de 1994: -“ Eles (Warner/Reprise) disseram que havia um público para o que eu estava fazendo, mas não tinham nenhuma idéia de onde ele estaria ou de como alcançá-lo, mas os discos estavam vendendo e havia difusão em todo o mundo. Realmente, uma vez eu recebi um cheque da BMI da Albania ou Paquistão no valor de $22.50, então as pessoas ainda estavam me ouvindo”.

TOM RAPP & PEARLS BEFORE SWINE – CULTS!

Depois de uma audiência, o advogado da parte contrária perguntou:

“Peraí, você é o TOM RAPP, do “PEARLS BEFORE SWINE”?” E a resposta: “Sou sim”!

E o advogado: “Meu Deus, mas que honra! Você foi um dos meus ídolos, na juventude!”

A conversa espalhou-se e um “sumido” da história do POP foi redescoberto em sua reconfiguração!

Em 1977, já de saco cheio, e depois de um show abrindo para PATTY SMITH, TOM RAPP encerrou a vida artística.

Havia gravado sete discos; e ele calculava que não havia ganhado $ 200 ( duzentos dólares ), uns R$ 1.100,00 MANDACARUS com eles em mais de dez anos de carreira!!!!

Foi roubado várias vezes. O seu primeiro álbum para a pequena e cult ESP-DISK, vendeu 200 mil cópias! E ele não recebeu um centavo! E nem do segundo que também fez por lá! A indústria da música tem antros e desvãos!!!! Em parte, sempre foi administrada por bandidos comuns e mafiosos….

TOM RAPP contou, rindo, que na juventude ficou na frente de um certo ROBERT ZIMMERMAN em concurso de poesias! Ele era um poeta, letrista, que construía imagens fortes, letras em que são possíveis visualizar os personagens, enredos, etc…

Quando surgiu em 1967, o VILLAGE VOICE, jornal underground de Nova York, escreveu sobre “ONE NATION UNDERGROUND”, o primeiro disco de sua banda, o “PÉROLAS PARA OS PORCOS” …OOOPS!!!! “PEARLS BEFORE SWINE”, que RAPP seria cult por causa de seu jeito de “poetar” e a qualidade de suas músicas! E acertou!

As capas dos dois LPs da ESP-DISK são reproduções de obras de arte inquietantes. Em ONE NATION UNDERGROUND, 1967, está a pintura de HIERONYMUS BOSH, “GARDEN OF DELIGHTS”, absurdamente vanguarda para o século XVII!

E BALAKLAVA, 1968, traz “O TRIUNFO DA MORTE”, de BRUEGEL.

Ambas são pinturas “psicodelicamente aterrorizantes”! E, de certa maneira expressam os medos e horrores do mundo, em metáfora transposta para meados da década do 1960!

A grosso modo, TOM RAPP teve duas fases mais ou menos consequentes, mas com certas diferenças de tom.

Começou nitidamente FOLK – PSICODÉLICO; tem pontos experimentais, e algum RAGA-ROCK. Depois rumou para o COUNTRY-ROCK de maneira algo esquiva, mas clara. Melodicamente, soa vez por outra como o LOVE. Mas, de fato, tem quê de DONOVAN, e muito de DYLAN. E algo indistinguível do próprio TOM, que é, sim, um verdadeiro estilista!

Há, também, música que deu encrenca, mas que só os chatos que compreendem a linguagem da telegrafia perceberam. E, na época, estava ainda cheio de profissionais que sacavam. MISS MORSE tem acompanhamento feito por um telégrafo que “transmite” obscenidades! Ideia, muito interessante, convenhamos!

O famoso D.J. das rádios, MURRAY THE K teve problemas com a polícia por causa disso. Ele também não sabia o quê estava tocando no programa dele…

O PEARLS BEFORE SWINE gravou belas, darks e tristes melodias. A coletânea aqui postada, “CONSTRUCTIVE MELANCHOLY”, tem título preciso e primoroso. Descreve o que há dentro do disco. E abrange os discografia da segunda fase.

Ouça de qualquer forma “THE JEWELER”: canção emocionante, descritiva, linda, visual e profundamente melancólica!

A maioria dos cinco LPs, lançados pela REPRISE, na década de 1970, foram gravados em NASHVILLE, com músicos de alto nível, que deram aos discos um standard de qualidade.

TOM “anasala” sutilmente o cantar, emulando DYLAN e quase todos que pularam para o COUNTRY, e o COUNTRY ROCK.

Os discos não venderam; só pra variar…

O gás acabou, e TOM RAPP mudou de vida.

Voltou a estudar, formou-se em economia, depois em direito e tornou-se advogado de “direitos humanos”, defendendo militantes e outros marginalizados pelo sistema.

Sua vida profissional posterior manteve a coerência de suas posições artísticas. Vez por outra, apresentou-se em alguns festivais, e influencia gente como DAMON & NAOMI, do GALAXIE 500, e um vasto punhado de artistas não convencionais.

O “PEARLS BEFORE SWINE” é velho admirado meu. Comprei os dois primeiros discos em edições originais na ERIC DISCOS, talvez início dos 1980. Hoje, eu tenho edições especiais em CDS.

TOM RAPP assumiu atitude que admirei profundamente. Ele soube parar quando concluiu que era o melhor a fazer.

Não julgo fracassados os que desistem. Uma carreira é muito mais do que ganhar muita grana, “dar certo”, essas coisas prestigiadas acriticamente pelo mundo em geral.

Ele desenhou sua carreira, e a levou enquanto achou que deveria. Fez canções exuberantes, colecionáveis, apreciáveis, densas. E morreu em 2018 de câncer.

Parar pode ser um modo de estar para um jeito de ser! É um direito, e não um fracasso.

TOM RAPP não será esquecido! É cult de verdade!
Texto original em 21/01/2021

ELIS REGINA: 40 ANOS SEM ELA

Memórias a gente escava do jeito que se faz nas buscas arqueológicas. Vai fundo, porém atenta e cuidadosamente. Elas não são nítidas, e muito menos ressurgem completas.

Então, vez por outra, recupera-se algum objeto, algo perdido sob escombros, encoberto pelo esquecimento.

Não costumo escrever sobre o que não domino com certa proficiência. Não sou crítico ou pesquisador de MPB. Tento, apenas, realçar memórias para mim mesmo. Eu gosto de música, e por isso ouvi a ELIS REGINA em vários contextos. Aliás, muita e muita gente, também.

Eu recordo um show que assisti, acho que no TEATRO PARAMOUNT, em SAMPA. Provavelmente, em 1966/1967. Ganhamos ingressos, eu e meu “amigoprimo” BETÃO, talvez de nossos tios JULIANO ou ABRAMO GARINI, ambos músicos profissionais.

Foi evento exclusivo, penso, promovido pela ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL. Estavam lá os que faziam sucesso, e os artistas em ascensão.

Foi ecumênico: gente da MPB de tudo o que era jeito: BOSSA NOVA, BREGAS e SAMBISTAS… E o pessoal da TROPICÁLIA e da JOVEM GUARDA. Todos revezando aparentemente sem ordem mais explícita. Tocavam ou cantavam uma ou duas músicas, “AND THE SHOW GOES ON…

Claro, eu tinha uns 14 anos, se tanto… e meu negócio era o POP/ROCK internacional, universo que me fascinava desde a infância.

Lembro pouco. Uma das bandas que se apresentou foi THE REBELS, instrumental SURF/BEAT, na linha dos SHADOWS, dos VENTURES, e dos JORDANS – também brasileiros. Eram razoáveis. E quase com certeza MARTINHA, WANDERLEIA, DEMÉTRIUS (não, não o MAGNOLLI…) ANTONIO MARCOS… gente da JOVEM GUARDA…

Houve a turma do samba: MOREIRA DA SILVA, e GERMANO MATHIAS eu lembro bem; e alguns bregas irremissíveis, como RINALDO CALHEIROS e SILVANA. E gente flanando entre o auge e a decadência. Mas, todos conhecidos.

Fiquei impressionado com uma garota muito jovem, tremendamente expressiva, e de voz enorme que atravessava o meu estômago e batia contra a muralha de toda a plateia: era MARIA BETHANIA! Cantou CARCARÁ seu incrível, contestatário e enorme sucesso, presente em todas as rádios do país!

BETHANIA está entre as performances mais esfuziantes e inesquecíveis que assisti em toda a minha vida! Não era e não é minha praia; mas, não havia como não admirar o talento abundante e agressivo, aplicado com a precisão de um BOTICÃO arrancando um molar…

Certa vez, ouvi no rádio um quase obituário exposto pelo JOÃO MARCELO BÔSCOLI, filho de ELIS, e o PROFESSOR PASQUALE.

O mestre é onipresente lutador para que a gente aprenda melhor o português. Imediatamente recordei que a ELIS REGINA também estivera naquele SHOW. Apareceu nitidamente dentro da minha cabeça. Eu a revi no palco!!!

Por muito tempo, eu não a compreendi adequadamente. Achava que sua bela, potente, enorme extensão vocal, era utilizada de forma explícita demais.

No entanto, fui percebendo que era isso mesmo que tinha de ter sido feito: ora, se ARETHA FRANKLIN podia, por que não ELIS?

Duas cantoras populares, com imensos atributos explorados e produzidos para se destacarem.

Elas sempre me impressionaram. Eu gosto muito dos LONG PLAYS de ELIS como JAIR RODRIGUES, acompanhados pelo JONGO TRIO. Os discos foram batizados DOIS NA BOSSA, volumes 1,2, e 3.

Aprecio, mais ainda, o espetacular e imprescindível “O FINO DO FINO”, com o ZIMBO TRIO, de 1965!

São quatro shows da melhor fusão SAMBA/JAZZ expandidos ao estado da arte! É onde a versatilidade vocal e interpretativa de ELIS REGINA se realça!

A imensa discografia e repertório de ELIS descobre e desvenda a tradição e a modernidade crescente da MPB.

Ela revelou ou deu oportunidades para GILBERTO GIL, MILTON NASCIMENTO, CHICO BUARQUE, BELCHIOR, ALDIR BLANC.. e tantos e muitos mais.

Inclusive “reesculpiu” a música de ADONIRAN BARBOSA, gênio único da velha guarda, culturalmente relevante, e em plena forma estética.

A trajetória de ELIS se refina com a maturidade e consolidação de nossa melhor música! Que o diga o clássico e cult imprescindível ELIS & TOM (JOBIM, claro!), gravado em 1974?

Nessa transversal do tempo, ELIS foi cantando cada vez melhor! Aperfeiçoou a emissão da voz, conteve exageros e explicitudes algo teatrais. E se tornou paulatinamente mais moderna e atualizada.

A discografia de ELIS REGINA está composta por 6 discos ao vivo, 18 gravados em estúdio, e mais 6 discos póstumos. Há participação em outros projetos. Seja como for, 30 discos para carreira de pouco mais de 20 anos é muita coisa!

O BOX aqui postado compreende os LONG PLAYS originais por ela gravados. São os 23 LPS de carreira e duas coletâneas exclusivas.

Ficou fora ‘VIVA A BROTOLÂNDIA”, 1962, sua estreia fazendo algo tipo CELY CAMPELLO. É fora de foco. Não era a dela.

Artistas e todos os que viveram nas década de 1960 /1970, têm a sina e a glória de haver sofrido ou participado de transições políticas, comportamentais, artísticas e filosóficas. Momentos cruciais e excruciantes.

ELIS REGINA da mesma forma que JIM MORRISON, JANIS JOPLIN e JIMI HENDRIX, para ficar nos maiorais seus contemporâneos, foi vítima de excessos, do trabalho insano, e da vida vertiginosa daqueles tempos dilacerantes.

Passaram todos pelo frigorífico existencial. Carnes açoitadas, moídas, e consumidas. Gente que teve muita vida potencial desperdiçada.

Para eles todos restou a glória dos mártires. Para nós, ficou o vácuo da perda precoce dos que ainda tinham muito para produzir e legar.

Lágrimas eternas e nada ocultas para ELIS. Ela merece; e nós precisamos!

JEFF BECK – A CONSTRUÇÃO DA CARREIRA DE UM GÊNIO MULTIFACETADO. (PARTE 1) – DOS YARDBIRDS A BECK, BOGERT & APPICE

 

– NÃO PARA!!! CONTINUA!!! TÁ MUITO BOM!!!!

– MAS, STEVIE, EU NÃO SOU BATERISTA!!!

– SEGUE! A PARTIR DE AGORA, O CUSTO É POR MINHA CONTA….

Certo dia, em 1972, STEVIE WONDER entrou dançando no estúdio ELECTRIC LADYLAND, em NOVA YORK, onde meio secretamente estava gravando para depois fechar novo acordo financeiro com a MOTOWN…

O disco tornou-se “TALKING BOOK”, o início da renovação vitoriosa de sua espetacular carreira!

Foi assim: JEFF BECK, um dos músicos que participava da sessão, adorava “dedilhar” ( OOOPPPSSS!!!) a bateria escondido. E WONDER o percebeu fazendo o que viria a ser o RIFF de bateria na entrada de “SUPERSTITION”, um de seus clássicos!

Gravaram imediatamente a DEMO, e a MOTOWN aprovou. Renovou o contrato de WONDER por muito mais grana, além de permitir liberdade artística para STEVIE criar…

A música foi cedida a BECK como parte de pagamento pelas sessões em que trabalhou.

E o nosso herói comentou que, sem querer, tornou-se parceiro em dois grandes RIFFS da História. A bateria e seu ritmo dançante, conjugada ao RIFF do teclado desenvolvido por STEVIE WONDER! Inesquecível!

O acaso é um grande realizador! E demolidor implacável, também, como veremos!

Alguém citou para mim dito popular de MOÇAMBIQUE: “Se a sorte não penetra, tens no C#, e etc…”

Explícito e definidor…

JEFF BECK estudava piano desde os 4 anos, e um dia arrancou tecla do instrumento… Mamãe BECK entendeu que a do rebento era outra…

Aos 8 anos, ele construiu uma guitarra para emular seu ídolo, CLIFF GALLUP, guitarrista de GENE VINCENT. Aliás, um dos ídolos de JIMMY PAGE, também…

Os dois se conheceram porque a irmã de JIMMY estudava com JEFF. Um dia foi visita-la e, enquanto mamãe PAGE fazia um chá, os dois ficaram tocando guitarra…

Precoce desde sempre, e inventor de instrumentos e sonoridades, BECK foi se enturmando até tornar-se meio conhecido com os TRIDENTS, banda onde tocou por quase 2 anos, e aprendeu a tirar sons e a fazer barulho…

BECK sempre se interessou por tecnologia, experimentações e máquinas… Mas, um desastre de automóvel, em 1969, foi outro acaso que quase líquida a carreira dele…

JIMMY PAGE lá por 1964/65 já faturava bem tocando em estúdios. Há dezenas de participações deles em discos da época.

E quando CLAPTON deixou os YARDBIRDS, ele foi a primeira opção para substitui-lo…

Mas não topou, e indicou BECK.

Depois de um SHOW, JEFF foi quase sequestrado por GIORGIO GOMELSKY, “empresário”. E bem ao estilo máfia russa da época, o convenceram que uma banda TOP precisava de um guitarrista, e o levaram ao MARKEE CLUB.

Eram os YARDBIRDS.

FOR YOUR LOVE, com CLAPTON na guitarra e BRIAN AUGER, no cravo, havia ido muito bem. Sucesso marcante, e meu primeiro contato com a banda. Parte do grupo queria seguir por ali…

Mas, BECK trouxe inovações na guitarra, e foi muito além de GEORGE HARRISON, em I FEEL FINE, hit dos BEATLES, e outro marco pouco reconhecido…

Quando entrou para os YARDBIRDS, JEFF percebeu a diferença de status e projeção. O sucesso com a mulherada era total, recordou: a VAN da banda estava sempre com marcas de batom, telefones, endereços e os etcs… que compõe o sucesso dos POP STARS…Gostou, é claro!

E as ideias futuristas de JEFF BECK grudaram na performance do grupo.

Os SINGLES fabulosos de sua curta era, “HEART FULL OF SOUL”, “OVER, UNDER, SIDEWAYS DOWN”, “YOU ARE BETTER MAN THAN I”… e mais outras gravações seminais, algumas com a participação de PAGE, como “HAPPENING TEN YEARS TIME AGO”, revolucionaram e “liberaram” a guitarra para brilhar e tornar-se o ponto focal do ROCK de meados da década de 1960 em diante.

BECK FOI A ORIGEM DO NOVO JEITO DE TOCAR E FAZER AS GUITARRAS SOAREM.

Certamente influenciou a metamorfose no som de CLAPTON, quando no CREAM, que por sua vez, influenciou JIMI HENDRIX…

E a espaçonave decolou eras adentro.

HARD ROCK, HEAVY METAL, DAVID GILMOUR, PROGRESSIVOS, e tantos e tamanhos que trouxeram o que até hoje é ouvido “pelaí”.

É instigante especular sobre as tendências e realizações artísticas de CLAPTON, PAGE E BECK.

Claro, eles todos originários e interessados no BLUES e no ROCK. Mas, muito diferentes entre si.

CLAPTON é e permaneceu um BLUES MAN, com viés competente no POP.

Explorou um pouco o REGGAE, e até a BOSSA NOVA, sempre em FUSÃO com o POP JAZZ, onipresente e cultivado…

Além disso, ERIC desenvolveu diferencial insuperável: CLAPTON SABE CANTAR. E muito bem! E isso fez toda a diferença no decorrer da carreira!

JIMMY PAGE é um grande produtor, e homem de estúdio focado essencialmente no HARD ROCK, com incursões no FOLK, audíveis em quaisquer discos do LED ZEPPELIN.

E, por mais de uma década, enquanto a banda performou, teve a seu lado o talento de JOHN PAUL JONES, até hoje grande arranjador e baixista; e principalmente ROBERT PLANT, ainda entre os maiores vocalistas de todos os tempos e eras.

Vantagem incontrastável para quem tem nenhum talento para cantar, não é mesmo…

JEFF BECK é um inventor de sonoridades e guitarrista incomparável!

Mas, sempre esteve limitado pela falta de talento vocal. Tem voz feia e canta mal. Então, aos poucos foi assumindo o interesse pelo instrumental e sempre trazendo, alguém para cantar.

Para BECK desenvolver a carreira foi mais difícil!. Ele extrapolou o BLUES ROCK em TRUTH, 1968 e BECK-OLA, 1969, quando reinou ROD STEWART, em disputa suicida com o próprio BECK pela primazia na banda.

Claro, tinha de acabar como terminou…Chuva de Egos e o derretimento de um grupo notável…

É memorável, em TRUTH, a faixa cult “BECK´S BOLERO”, executada por SUPERGRUPO histórico: BECK e PAGE nas guitarras; JOHN PAUL JONES, no BAIXO; e NICK HOPCKINS, no piano.

KEITH MOON, estrela explosiva no THE WHO, literalmente arrebenta a performance destruindo a bateria. É faixa de referência, tanto quanto ‘BLUES DE LUXE”, onde ROD STEWART e JEFF BECK dão aula de ENGLISH BLUES & beyond…

TRUTH é um clássico da época, e modelo para o LED ZEPPELIN I,1968, moldado por PAGE no disco de BECK. É a história e suas contradições em movimento.

Na entreato torrencial de 1968/1970, aconteceram os primeiros discos do JEFF BECK GROUP, e os três iniciais do LED ZEPPELIN.

JIMMY PAGE estava em alta como produtor e músico de estúdio, e participou de vários projetos paralelos.

Destacando as participações de BECK, há um disco polêmico, de fama ciclotímica no correr do tempo. Para muitos, LORD SUTCH & HEAVY FRIENDS, 1970, é ruim.

Eu discordo veementemente! Como um grupo base com PAGE, BECK, JOHN BONHAN e NOEL REDDING, baixista de HENDRIX, poderia legar um disco ruim?

Para os que duvidam, há duas faixas sensacionais: “WOULD YOU BELIEVE” e “BRIGHTEST LIGHTS” com BECK e PAGE acompanhados por outros craques.

No mais, é pauleira brava! Debochado, gritado, meio PUB/PUNK ROCK e não alinhado com a moda.

Os tempos exigiam o BLUES, o HARD, e o nascente ROCK PROGRESSIVO.

Ainda assim, o disco é um clássico!

Curiosos são dois álbuns duplos, também lançados no BRASIL posteriormente, que trazem a nata daquela época.

BLUES ANYTIME vem com os três seminais da guitarra, mais ROD STEWART, SAVOY BROWN, e vasto montão de craques em faixas desconhecidas. É item de coleção disputado.

Somam, é óbvio, para a compreensão dos caminhos trilhados por JEFF BECK, que buscou seguidamente o menos frequente RHYTHM´N´BLUES.

E o resultado é o fantástico “blend” MOTOWN/ STAX, em discos como “ROUGH AND READY”, 1971; ou “JEFF BECK GROUP”, 1972 – produzido por STEVE CROPPER, tido por muitos como guitarrista dos guitarristas. E ELE é.

E, JEFF saltou mais de uma década para desaguar na DISCO e na DANCE MUSIC, com FLASH, 1985, produzido alternadamente por NILE RODGERS (CHIC) e ARTHUR BAKER.

E devemos observar JEFF BECK no segundo álbum do inglês SEAL, de 1994, onde participa com sua verve, estilo e técnica, depois de terem colaborado em STONE FREE, tributo eclético a JIMI HENDRIX, lançado em 1993.

Tudo considerado, é o R&B modificado que sempre fascinou BECK, um cultor de sutilezas melódicas. Álbuns excelentes, em tempos diversos que certamente complementaram ciclo criativo para JEFF BECK.

Nos movimentos oscilantes que a carreira lhe trouxe, tudo foi arrematado com peso pelo POWER TRIO redivivo, exalando RETRÔ em HARD BLUES/ROCK:

Em 1972 , BECK, BOGERT & APPICE emularam o CREAM e o MOUNTAIN, fizeram sucesso de público, conseguiram disco de ouro, turnês, etc….

E definitivamente convenceu JEFF de que seu caminho era outro, mais sutil e independente.

Cronologia é bom artifício para fixar ideias. Mas, os movimentos nas artes e na vida, extrapolam aparências e coerências. Tendências vão e voltam; se imbricam é separam. É a vida agindo…

Para mais bem compreender a sequência da carreira de BECK, vamos recorrer à dialética ( eta cara chato! larga de ser pedante, TIO SÉRGIO! ) e ao papel do contraditório, também.

A lógica de cada indivíduo, de cada artista, é o compósito criativo que a vida e a prática os torna.

Então…

CURT BOETTCHER – O SUPERDOTADO CRIATIVO DO

“SUNSHINE POP”.

Lembrei-me de CURT olhando discos, e tocando músicas que estão quase deixando de serem catalogadas como “OLDIES, para ingressarem no degrau abaixo da memória, e se tornarem VINTAGE.

Então, recorri aos meus “ALFARRÁBIOS”, como a revista RECORD COLLECTOR, que fez enorme ensaio sobre ele, em 1998! E, obviamente, à minha discoteca.

BOETTCHER foi músico e produtor, atuou na DÉCADA DE 1960, em meio ao mais criativo ambiente musical americano daqueles tempos, a CALIFÓRNIA.

Para os que não sabem ou não se recordam, entre 1965 e 1970 houve explosão de estilos, grupos e propostas de todos os tipos que foram genericamente batizados por “FLOWER POWER”.

Perscrutando com mais detalhes, há três subgêneros mais ou menos definíveis, mesmo que totalmente inter-relacionados: “GARAGE ROCK”, “PSICODELIA” e o agora conhecido por “SUNSHINE POP”. Na prática da época era “tudo junto ao mesmo tempo agora”.

CURT BOETTCHER foi mago da produção do chamado SUNSHINE POP. Era exímio “articulador de vozes”, principalmente. Os delicados arranjos MULTI-VOCAIS que fez e produziu levaram à parada de sucessos grupos como “THE ASSOCIATION” – que teve seu primeiro LP produzido por ele. E músicas como CHERISH estão entre as mais tocadas em todos os tempos, e permanecem no imaginário popular até hoje.

Aqui estão alguns discos em que ele cantava, além de orientar a produção geral. A característica de todos é a beleza melódica, o MULTI-CANTO afinado e quase etéreo, além de algumas transgressões criativas típicas do POP-ROCK PSICODÉLICO.

Se você gosta dos “MAMAS & THE PAPAS” ou SPANKY AND OUR GANG, vai adorar grupos como “SAGITARIOUS”, “ETERNITY CHILDREN”, ou “MILLENIUM”. Tio Sérgio garante: são discos lindíssimos!

CURT impressionou BRIAN WILSON, e produziu discos de outros membros dos BEACH BOYS.

A turma ligada aos BYRDS também o admirava. E GARY USHER, o produtor da banda, coproduziu e lançou esses discos aqui pela Columbia.

Fizeram quase nenhum sucesso. Com exceção de Mrs. BLUEBIRD, single magnífico dos ETERNITY’S CHILDREN, que entrou no fundo da parada norte-americana, em 1968, e que demorei mais de 30 anos para identificar, e conseguir o CD aqui postado!!!!

Mas, os tempos os tornaram cults e colecionáveis…

Você dirá: “What porra it´s that compacto simples na foto?” E Tio Sérgio explica: é uma pequena joia FOLK-PSICODÉLICA, lançada no Brasil, em 1967, pela ROZEMBLIT. Não aparece em nenhuma coletânea conhecida. Mas, foi uma das coisas produzidas por CURT BOETTCHER e por ele renegada, e agora sumida nos desvãos do tempo…

Vale procurar e ouvir o que CURT fez.

ELIZETH CARDOSO E ARACY DE ALMEIDA. O QUE TÊM EM COMUM ESSES DOIS DISCOS?

Sou gato de bibliotecas e discotecas.

Ando por elas assediando ( palavrinha da moda, heim ! ), cheirando e apalpando bumbuns e outras partes de discos e livros; lendo contracapas e orelhas; observando os designs gráficos, e os selos de gravadoras.

Tudo considerado, ckntinuo cumprindo um ritual que me fascina, desde criança, por coisas gravadas e impressas.

Acho que gosto mais dos “objetos” discos e livros, do que da “escutação” ou das leituras.

Claro; mais ou menos. Estou exagerando… Sou meio grávido de músicas ouvidas e leituras feitas.

Muita ainda é ou foi feita pela metade; por pequenas partes e muito pouco método. Assimilei muito através da sensibilidade; ou por osmose e gravidade ( caíram sobre mim …) É um hobby viciante. Não largo nem por ameaça ou porrada literalmente aplicada .

Recentemente, eu andava atrás de cds lançados pela GRAVADORA ELENCO, na década de 1960. São fascinantes! Um acervo diferenciado, criado, gravado e produzido por ALOYSIO DE OLIVEIRA , que juntou patos e sapatos; jacarés e tigresas; a velha guarda e os modernos artistas da época.

Era uma gravadora temática, BOUTIQUE sonora refinada, como a BLUE NOTE e a VERVE, americanas, exemplos magníficos.

Vagando pelo virtual cheguei em um disco lançado na ELENCO, em 1966, chamado “SAMBA É ARACY DE ALMEIDA”.

É muito interessante. ARACY era sambista da velha guarda. E, nesse disco gravou os compositores clássicos como NOEL ROSA, ASSIS VALENTE e ARY BARROSO. E, também, MARCOS VALLE, atualíssimo ainda hoje!

O diferencial é que ARACY está acompanhada pelo conjunto de ROBERTO MENESCAL, e a produção de AlOYSIO trouxe todo o repertório para o som contemporâneo da época do lançamento. E ARACY canta com leveza e descontração.

O resultado é BOSSA NOVA de verdade.!

Inspirado nela escutei, também, o “CULT” “CANÇÃO DO AMOR DEMAIS”, de ELIZETH CARDOSO, lançado em 1958, e por muitos considerado o primeiro disco gravado de BOSSA NOVA, porque as musicas são de TOM JOBIM e VINÍCIUS DE MORAES; e JOÃO GILBERTO toca violão – mesmo que sem as ousadias que vinha desenvolvendo.

Porém, o disco é convencional. Feito para a voz de ELIZETH, e com destaque total para ela. Os arranjos de TOM JOBIM são bem feitos, e nada inovadores. Ele usa violinos, harpas e toda a tradição sonora do SAMBA-CANÇÃO, onde ELIZETH era mestra consumada.

Mesmo com “CHEGA DE SAUDADES” no repertório, eu acompanho a opinião do poeta e professor AUGUSTO DE CAMPOS: está longe de ser um disco de BOSSA NOVA.

Tempos atrás, a revista RECORD COLLECTOR fez resenha elogiosa e curta do disco, e lhe deu 4 estrelas. Uma chancela relevante!

Agora, ouvindo e comparando os dois discos eu cheguei a algumas conclusões:

Os inventores da BOSSA NOVA são, mesmo, JOÃO GILBERTO e TOM JOBIM. VINÍCIUS tangenciou o gênero.

O SAMBA CANÇÃO não transitou para a modernidade; não havia elos possíveis, já que, de certa forma, a BOSSA o contestava na sua “breguice” formal e no uso “açucarado ” das cordas – “assassina serial” de ouvintes diabéticos!

Mas, era um jeito americano de fazer e arranjar músicas, contemporâneo à grande canção americana da época. É só dar uma olhada nas paradas e identificar…

De outro lado, o SAMBA DE RAIZ forma a base da BOSSA NOVA com naturalidade impressionante. A tradição de ARACY juntada ao “POP” de MENESCAL e sua turma, são exemplos claros. Ao adicionar uma colherada de JAZZ no otimismo dos tempos democráticos de JUSCELINO KUBISTCHEK, criou-se uma receita musical próxima da perfeição.

Bem, como gato velho, miei demais por aqui. Mas, acho que ainda mantenho parte do meu faro.

CANNED HEAT – CULT PSYCHEDELIC BLUES

ALTERNATIVOS sempre! E, ao mesmo tempo, “discutindo o conceito” do verdadeiro BLUES. Também TRADICIONALISTAS, mas longe do CONSERVADORISMO e da monotonia melódica do BLUES. No fundo “seriam” JOHN LEE HOOKER redivivo expandindo o ensinamento e a pegada criada por HOOKER.

Ideia Maluca?

Então vamos lá: BOOM BOOM, clássico de HOOKER, “está” em “SHOULD I STAY OR SHOULD A GO “, HIT do THE CLASH, gravado 1977. E, mais ainda, em THE BEAR, de JOHN MAYALL, 1968.

BOOM BOOM permeia redefinido em PSICODELIA o hit cult de NORMAN GREENBAUN, “SPIRIT IN THE SKY”, 1969;

E, também, no TRANSGRESSIVO ACID ROCK “ON THE ROAD AGAIN”, dos caras da foto, o próprio CANNED HEAT, já notados em 1968 por velhinhos como o TIO SÉRGIO, aqui!

E só para citar alguns filhotes espirituais, quando não criadores de plágios escarrados daquele RIFF SEMINAL E RECORRENTE perpetrado por JOHN LEE…

E há mais, muito mais! Perguntem pro Valdir ZamboniAyrton Mugnaini Jr.Mauricio Dos Santos NascimentoClaudio Finzi FoáGeninho PintoKlaus SveignerGerson Périco

O CANNED HEAT faz isso desde sempre. E para sempre. Têm muitos discos gravados. Um deles, clássico , com o próprio JOHN LEE HOOKER.

Eles usam o PAU DE MACARRÃO MUSICAL para abrir a massa do BLUES. São tradicionalistas e revolucionários ao mesmo tempo. Um fenômeno!

É o BLUES ALTERNATIVO transitando pelo tempo: é sessentista ou cheirando grunge. Tem pra todo mundo! AHHH, o CANNED HEAT faz coisas algo “PROG”, mas sempre BLUES…

Por tudo isto, há quem os adore, como o TIO SÉRGIO! Existem uns poucos que nem tanto…

E você? Vai testar?

Vale a pena ir fundo.